O capítulo perdido de Travessuras da menina má
Quando me mudei para a colônia Marte XXVI em 2118, jamais poderia imaginar as emoções que meu corpo de andróide seria capaz de processar. Até mesmo o amor.
Ao embarcar no ônibus espacial, o comissário depositou ao meu lado uma cabeça recém-descongelada inconfundível. Ao ver aquelas orelhinhas meio cobertas pelos cabelos agora arroxeados, os olhos muito pretos piscando sugestivamente, senti um rubor psicológico subir às minhas faces de silicone.
- Saudades de mim, bom menino?
- Vá sentar em outro lugar. Não quero mais nada com você.
- Não posso. Não tenho mais pernas.
- Eu mesmo a carrego. Diga onde a coloco.
(...algumas páginas depois...)
- É claro que eu ainda te amo. Tanto quanto a válvula que substituiu meu coração agora permite...
- Não se diz válvula, Ricardito. É nanoconstruto.
- Tanto faz.
José Wilker tem razão: Travessuras da menina má é um tanto repetitivo. Bobo. Trabalha dentro de uma lógica de fábula, em que há repetição e a graça está em pequenas quebras. Mas depois de um tempo, fica risível. Parece um livro de História. Os personagens-emblema no seu devido momento histórico de apogeu. Hippies nos anos 60, uma cenógrafa na movida madrilenha... por favor! É preciso demais. Quer dizer, se dessem isso às crianças ao invés dos livros de História, talvez elas gostassem mais da História. Mas este livro é supostamente pra adultos. Eu quero ver gente deslocada do seu tempo.
Dizem que pra criticar você tem que ser capaz de fazer melhor. Pois prefiro o meu livro novo, A feia noite. Maria Luiza é mais má e Francisco é mais Fukuda.