27.2.08

Vi a Mallu Magalhães no Altas Horas e as meninas da platéia torcendo os lábios de inveja, todas presas. Que triste. Mas ela lá, nem se tocando disso, e tocando. Isso me lembrou, bem, a minha adolescência.
Eu vou vê-la. Ela é bem mais barata que o Bob Dylan.

25.2.08

Encontrei um bom modo de explicar A feia noite:

"Francisco tem 37 anos. Apesar de ser marqueteiro político, fora de sua profissão é um homem extremamente correto e regrado num país onde o jeitinho impera. Mas tem a sensação de que a grande festa da existência está se desenrolando sem admiti-lo. Está tomando antidepressivos para estancar seus ataques de pânico e TOC, além de tentar salvar seu casamento. É ano eleitoral e estamos em janeiro, mês do alto verão imprensado entre as festas de fim de ano e o carnaval, onde todos saem de férias, inclusive o psiquiatra dele.
O livro abre com Francisco sendo abandonado pela esposa perua, Amanda, e entrando em parafuso. No dia seguinte, Francisco não se lembra de muita coisa. Há uma moça não em sua cama, mas na cama de solteiro do quarto das crianças (que sua mulher e ele mantinham mesmo sem filhos). Ela tem 21 anos incompletos e se chama Maria Luiza.
Sem saber o que aconteceu entre eles e sem coragem de mandá-la embora, Francisco lhe oferece asilo, sem saber nem as próprias intenções, quanto mais as dela. A partir daí o livro é dividido em noites, quinze ao todo. Logo Francisco descobre que Maria Luiza também exerce uma profissão desprezada pela sociedade: a de prostituta. Libertina, como ela prefere. Maria Luiza é exatamente o que Francisco sempre desejou em segredo: seu bilhete de ingresso para essa vida devassa e descompromissada -- mas por que ela estaria justamente deixando tudo isso?"

Há mais que isso, mas é uma parte que já começa a revelar demais.

21.2.08

As leituras da menina má

Tenho lido muito, muito. Estou lendo uma edição de sebo de Dublinenses (James Joyce) de que não gostei. Estou em dúvida se não gostei dos contos de James Joyce, do James Joyce ou da tradução. Mas tenho gostado de Dublin para valer. Como são contos, eu tendo a ler sempre o próximo esperando algo melhor. Alguns até se destacam no meio dos outros. Mas acho que não vou voltar a perder tempo com esse cara tão cedo.

Garotinha demoníaca, bebê-de-rosamaria. Como se não já soubesse. Todas as crianças prodígio são maléficas. E depois que crescem - bem, ninguém jamais sobreviveu pra contar.
Frase do A feia noite sobre criancinhas prodígio maléficas.

O que estou amando de paixão é O jogo do exterminador (Ender's game), de Orson Scott Card. A tradução é meio manquitola, mas não me importa. Sou apaixonada por criancinhas prodígio bizarras. Adoro ser a mentora delas, atração fatal que um dia pode me fazer acabar numa vala - o lance do aprendiz superar o mestre etc. - mas é irresistível. Eu lhes dou as revistinhas e os livros e demais apetrechos/subsídios necessários para fabricar gênios do mal.
Andrew Wiggin, apelido Ender, é um menino de seis anos, o caçula de três irmãos, todos wunderkind. O mais velho (Peter) é um psicopata, a do meio (Valentine) tem coração mole e Ender é o meio-termo. Por isso, é o escolhido para ser enviado a uma academia militar espacial para superdotados, onde rapidamente se destaca. Em parte porque os diretores e professores conspiram para isso. Sacaneiam ele de propósito para ele ficar mais ixxperto (eu conheço essa técnica - como hey, teacher, leave the kids alone). Enquanto isso, na Terra, o irmão psicopata convence a irmã coração mole a ajudá-lo num plano de manipulação mundial via internet. Ainda não acabei de ler. Mas tá ÓTIMO.



Clique aqui para ler minha história de criancinha prodígio maléfica associada a seita.
Pra quem sente esse fascínio, tem essa comunidade do Orkut: Demonic Tots/Diabolic Brats

12.2.08

Da arte de escolher o bicho certo

Resolvi me render ao estereótipo de escritor e adquirir um gato, como eu já tinha adiantado. O gato em questão se chama Bill Diesel, por ser o primeiro gato patrocinado pela Petrobras, tem 2 meses e pouco e gosta de fazer high five's comigo (mas só comigo). Achei de início que ele fosse anti-social, mas era só a falta de costume com o ambiente. Uma vez instalado e alimentado, o bicho começou a brincar (e a fazer high five's) com uma alegria insaciável. Mas quando quero trabalhar, só preciso dar a ele, digamos, uma sanfona feita das tiras da conta de luz, que ele me deixa em paz por umas duas horas. Também tem gostado de ficar dormitando no meu colo enquanto eu escrevo ou traduzo, como uma mini-estola de peles.
Seria muito chato ter um gato por exemplo parado demais. Ou espoleta demais. Ou tímido demais, tipo adolescente que não sabe se comportar com as visitas. Bill nem se enfurna sob a estante, nem morde quem se aproxima, como certos gatos sensíveis e mimados demais; nem deixa abusarem *demais* dele, porque afinal é discípulo de Pai Mei. Faz um pouco de gracinha, depois some de cena e deixa os adultos conversarem. E é nitidamente parcial: prefere o colo e o carinho das menininhas, mais macios. JP, o Pai Mei supracitado, declarou laconicamente após a primeira visita ao Bill: estou orgulhoso do gato.
Acho que escolhi o gato certo. Olhei bem em várias pet shops e apontei: é esse. Porque gato meu tem padrão de qualidade. Que nem o filho-que-terei-um-dia: pode ser qualquer coisa, desde que seja gênio.

7.2.08

don't fall for that

No meu último emprego tinha uma menina que, talvez por não saber como me apresentar, sempre me apresentava assim: "essa é a Simone, ela é escritora, é a próxima Clarice Lispector". Eu sorria como a uma criança que diz que é a She-Ra. Ahã.
Eu sei, eu sei, é que sou estranha. Flaky. E Clarice Lispector também. Somos muito recolhidas, fechamos as pessoas lá fora para convivermos conosco mesmas aqui dentro. Mas a semelhança pára por aí. Os jardins internos são bem diferentes. Os meus traumas e problemas são mais singelos, até divertidos por certo ângulo; não são, como os dela, traumas estruturais pelo mero contato com o oxigênio ao nascer, para ficar numa coisa só.
Temos alguns pontos de contato literários também; às vezes eu deixo meu texto emaranhado, fluxo-de-pensamento, mas não sugo o leitor pra dentro dele. Clarice ou suga, ou expele.
De vez em quando caio na armadilha: acabei de fabricar uma foto muito parecida com uma certa pose de Clarice, aquela com os zóio de lado. Eu queria fabricar algo nostálgico, com uma ilusão de lente olho-de-peixe, e este foi o resultado.
Mas olhando de perto, eu não tenho a menor intenção/ pretensão/ vontade de imitar a Clarice Lispector. No ensino médio, uma professora perguntou-nos se também sentíamos como ela "vontade de ter escrito aquilo", "inveja", ao lermos trechos excepcionais de algum autor (no caso era o Machado de Assis). Balancei a cabeça afirmativamente, por educação e pena, mas não sentia aquilo desde os dez anos no máximo. Depois entendi: é que eu escrevia de dentro para fora, e ela, a professora, de fora para dentro. De vez em quando tenho a impressão de que Clarice Lispector escrevia de dentro para dentro, o que é muito assustador. Aquilo de alguma forma escapou pelas fissuras e foi parar na mão de um editor.

Às vezes me perguntam como é que eu me sinto sendo uma escritora "tão jovem". Me sinto normal. Depois de passar por todas as fases - querer crescer e aparecer, deslumbramento com a ascendência, não fazer questão de aparecer, fazer força pra não aparecer mas sentir-se injustiçada por não ser lembrada assim mesmo - estou finalmente me sentindo normal. É como se eu fosse contadora. Escrevi essa profissão como exemplo de coisa chata mas, engraçado, eu sou uma contadora - de histórias. Estou pensando em termos tão de longo prazo. Talvez isso mude depois, não sei se é definitivo, mas... fico aqui ouvindo Royksopp e pensando, e escrevendo, e está bem bom. Estou me sentindo realizada, é isso.
É que logo depois de ter tido sucesso com meu primeiro livro não me senti bem, não. Me senti pior do que antes. Quando suas ambições são plenamente satisfeitas logo de primeira, tudo corre exatamente como você (só você) tinha certeza e esperava, é quase tão ruim quanto quebrar a cara. Sei disso porque já quebrei a minha, é claro. A única diferença é a realidade externa: com sucesso boa, sem sucesso ruim; mas nunca dei muita bola para isso de realidade externa. Minha realidade interna é muito mais premente.
Como explicar? De uma parte, é a maldição de Cassandra. Saber que vai acontecer não impede ou adianta ou muda o acontecimento, e uma vez acontecido, o ter estado certo não traz nenhuma alegria.
Aí você pensa que fazer as coisinhas que lhe pedem (sorrir para cá, acenar para lá) vai trazer algo de bom. Na maior parte essas "experiências" têm o mesmo efeito inócuo na sua vida que um biscoito Globo tem contra a fome. A propósito, não comi ninguém, ou, se considerarmos efeitos muito colaterais da "fama", quase ninguém.
Mas aí você escreve outro livro e percebe que a recompensa está naquilo mesmo. Em burilar sua obra, fazer um trabalho desvelado. Resta um pequeno fetiche pelo objeto-livro-com-seu-nome, pois se até cheiro ele tem - de velho, de novo, de gloss paper...
Imagino que seja assim para arquitetos, advogados, professores, cineastas, com suas obras corpóreas ou incorpóreas. Quando o e-livro vier, vou ter que me acostumar a ele.

6.2.08

"Muito trabalho" pega mal, não é? Bem, ando ocupadíssima fazendo as seguintes coisas: organizando meus contos inacabados para mandar para o editor e para duas revistas que mos pediram, debulhando a burocracia para receber meu patrocínio da Petrobras (eu e Speed Racer temos isso em comum, além do gostar da Christina Ricci), cumprindo os procedimentos finais para a adoção de um gato, vendo a quarta temporada de Alias, ponderando idéias recentes para um novo romance, escrevendo crônicas e lendo, lendo muito. Por prazer.
Terminei Joana D'Arc, que (dizem) Mark Twain considerava seu melhor livro. Não sei se recomendaria a qualquer pessoa, mas gostei. Ele conseguiu dar humor àquilo. Por falar nisso, quando acabei de ler, desci e assisti um pedaço do desfile da Viradouro com uma ala toda de Joanas D'Arcs com foguinhos-frufrus nos braços, e braços de mentira amarrados num poste, pro alto. Me escangalhei de rir, mais pelo absurdo do que pela coincidência.
E aí comecei a ler O tempo dos simulacros, de Philip K. Dick, my preciousss que foi tão difícil de encontrar.
Acho que dá para chamar isso de férias produtivas.