25.11.09

Emília

O personagem moralmente reprovável, mas irresistível, é um recurso usado pela literatura do mundo todo, mas no Brasil ele vira uma pedra angular. Basta pensar em Nelson Rodrigues - que, pelo óbvio ululante, nem vou desenvolver - e em Monteiro Lobato. De que seria sua obra infantil sem Emília? E, no entanto, é uma bonequinha egoísta, ambiciosa, arrivista, preconceituosa, orgulhosa etc. etc. etc. "São esses os valores que queremos ensinar aos nossos filhos?" Vocês eu não sei, mas eu não encaro livro só como exemplo direto de comportamento; pode ser só ficção, gostoso de ler; pode ser anti-exemplo; pode ser que a criança imite a Emília um tempo, nos aspectos bonitinhos. Mas não é só isso: Emília é eminentemente brasileira, só que sem hipocrisia.
Isso funciona como a violência catártica dos contos de fada: viver aquilo por procuração conta como experiência. Vendo o mal sem disfarces, a criança aprende a distinguir suas formas mais tênues, hoje tão em voga. Proibir qualquer coisa que remotamente cheire a mal parece com superproteção, mas na verdade desprotege a criança contra um mundo cheio dele, e, se ela nasceu com um talento especial para o mal, certamente isso não impedirá que ela o aproveite. Hoje em dia as pessoas não são mais reprimidas - também acho desnecessário desenvolver -, ou melhor, só se reprimem quando acham que vai pegar mal. As pessoas também não se manifestam/defendem/apartam dos linchadores de inocentes ao verem algo reprovável só porque têm medo de serem excluídas. Oras, até pela bunda-molice onipresente, ninguém vai ter peito pra te excluir só porque você falou a verdade. É capaz até de começarem a gostar de você. Vai fundo!
Isso aprendi com a Emília e o JP.
Ah, a propósito: carioca É porco.

12.11.09

O meu problema é que nunca consegui ser muito brasileira. Sou inglesa demais (ou oriental, preferem alguns). Por algum motivo, as coisas de que os outros brasileiros gostam me deprimem.
Concurso público: brasileiros acham ótima a estabilidade no emprego. Eu acho o quê?? Sísifo pelo menos fazia um pouco de exercício e ficava ao ar livre.
Ser cantada na rua: brasileiros acham que todo mundo ganha: o rapaz, que exerce sua masculinidade de forma saudável e vê uma forma bonita, e a moça, que tem sua auto-estima reforçada. Eu acho que o rapaz é um bronco em não ver que meu caso é diferente e que, se auto-estima precisa de um pedreiro pra funcionar, simata de uma vez.
Jogo de futebol: brasileiros acham divertido gritar MENGOOO! PORRA! e soltar fogos pela janela à meia-noite. Fico tentada a soltar fogos durante jogos não-tradicionais, seja no fuso horário que for, para ver se não incomoda mesmo. Fórmula 1. Tênis. Lacrosse.
Permissividade: brasileiros toleram comportamentos tipo chegar tarde, aumentam a nota "uns pontinhos", dão "um jeitinho" e uma "passadinha" na festa. Lá pelos meus seis anos, exigi a abolição do diminutivo da língua portuguesa - ou pelo menos do trato comigo - em parte por causa disso.
Birita: brasileiro acha que beber é subversivo e revolucionário. Eu acho OK beber, até cair se você achar necessário (gloriosa Escócia!), mas essa mentalidade é extremamente adolescente. Soltar elucubrações sobre as marcas que você bebe ou como beber é bom ou contar seu coma alcoólico não vai me impressionar. Você é Baco? Noé? Inventou o vinho? Então não é original já faz uns milênios. Calaboca.

Barulho demais, desordem demais, falta de cultura demais. Gosto de chá. Não gosto de hipocrisia. Lassidão e baderna, só nos horários e locais predeterminados com pessoal autorizado, e aí me entrego com gosto; de resto, no loitering.
Pelo menos não posso reclamar da falta de material literário.

11.11.09

É o calor sim

Hoje tomei uma decisão. Passei os arquivos de trabalho para o laptop e me tranquei no quarto com ar-condicionado. Me rendi porque o trabalho não estava rendendo nada nesse calor nublado e pegajoso que é muito pior que sol aberto. Adivinha se aqui não estou pensando muito melhor - muito mais rápida e claramente - e produzindo que é uma beleza.
Só fico pensando em quantos professores de Ensino Médio não advogavam aquela ideia de que o clima tropical úmido não tem nada a ver com brasileiro não gostar de trabalhar. E em quantos não tentaram instilar que brasileiro é um povo trabalhador, nada preguiçoso, que Macunaíma é um ultraje etc. etc. etc. Sei. Ainda estou para ver um deles topar corrigir prova no meio da Mata Atlântica. E, pela minha curta experiência em escritório, brasileiro é um povo que fica no trabalho muito tempo - até ganhando hora extra - sem necessariamente trabalhar. Isso em uma empresa privada. No serviço público, nem se fala.

9.11.09

Na companhia de babacas

Sobre a Uniban e gostosas tentando se ilustrar, pensei o seguinte:

Quando eu tinha 13 anos e, da noite pro dia, fiquei gostosa, considerei mentalmente esta nova opção: entretenimento adulto. Até então, eu parecia destinada a ser nerd, mas naquele ponto poderia escolher entre uma carreira de nerd e uma carreira de gostosa.
Não suportava ter que ser interessante para a massa. Se eu fosse tentar a carreira bas-fond, certamente eu miraria nos generais, não nos soldados (Dietrich mode on). MAS...
O ponto decisivo para continuar investindo (pondo os XP points) na nerdice foi a companhia. Eu detestava os zé-punhetas da minha sala. Agora, imagine uma profissão que transforma homens crescidos em babões de 13 anos, tenham a inteligência ou a posição social que tiverem. No fundo foi por isso que desisti da carreira no entretenimento adulto em favor da nerdice, e não por um motivo moral mais elevado (e certamente não pelas recompensas financeiras, heh).
Acontece que o buraco é mais embaixo. O macho brasileiro ainda não trabalha nas duas fases, mulher bonita E inteligente. Resultado: há intelectuais que conversam muito direitinho com outros portadores de pênis, mas quando uma menina bonita entra no palco, só usam a gente como escada-zorra-total. Numa metáfora voleibolística: não levantam a bola para a gente cortar, ressentidos como Irmãs Cajazeiras. Talvez porque aquelas ali não caiam fácil na lábia.