O cigarro eletrônico é um dispositivo a bateria que produz vapor (e não fumaça) a partir de uma resistência. É usado geralmente com essências aromáticas feitas à base de produtos usados na indústria alimentícia e cosmética (como a glicerina vegetal) que contêm certa dosagem de nicotina, estipulada na embalagem. É muito adotado por quem deseja parar de fumar. Não por fazer bem, mas por fazer menos mal que o cigarro: não contém os tóxicos da queima nem os aditivos usados pela indústria de tabaco. Além disso, cigarros eletrônicos significam economia: as partes, intercambiáveis, podem ser compradas individualmente; o líquido é fácil e relativamente seguro de fabricar na própria casa, e totalmente customizável – a pessoa pode até ir baixando o teor de nicotina até o zero, se quiser.
No entanto, é um dispositivo proibido no Brasil pela Anvisa.
O copinho menstrual é um copinho feito de silicone médico que substitui o absorvente. Como qualquer coisa de silicone que vá ter contato com áreas íntimas, deve ser esterilizado em água fervente por três minutos (antes e depois de usado, diz o manual). Basta aprender a encaixá-lo na vagina de maneira a formar um vácuo, e pronto: o conforto é sem igual. A economia é imensa. O cheiro diminui drasticamente, pois o sangue não oxida em contato com o ar (só na hora de esvaziar).
Mas uma amiga usuária de copinho ouviu da ginecologista: “nossa, mas você gosta mesmo de ficar mexendo lá dentro, não é?”.
Os anunciantes da mídia não precisam falar com todas as letras aos veículos noticiosos que preferem não ver matérias sobre esses produtos que machucam seus interesses, mas às vezes falam: quando você encontra aquela matéria pisoteando o cigarro eletrônico como se fosse o pior dos venenos, por exemplo. O usuário de cigarro eletrônico (ou vaper, como preferem ser chamados) chega a vibrar: é a confirmação de que está preocupando a indústria que um dia o escravizou. No caso do copinho menstrual, temos o silêncio ensurdecedor dos cadernos e revistas “de mulher”, que preferem falar de moda e beleza (e libido e bebês e carreira, nessa ordem). Mas existe o boca a boca: uma amiga evangeliza a outra sobre os benefícios do copinho e dá dica de marcas, tipos, manutenção... quase uma convenção das bruxas.
A internet possibilitou que as pessoas se comunicassem, se informassem e comercializassem por fora dos monopólios. Talvez esses fenômenos sejam mais visíveis nas indústrias ligadas a mulheres: algumas delas desistiram de usar métodos hormonais de contracepção por acreditar que a carga hormonal é danosa; outras assumiram os cabelos cacheados, após anos de chapinha, com um método que pode ter baixíssimo custo (low poo/no poo). Outras desistiram de depilar as axilas ou tingir os cabelos brancos. Outras, por outro lado, descolorem e tingem as axilas. Ou seja: não é mais uma questão de “fazer as grandes indústrias arrancarem os cabelos”, e sim de desafiar nossas próprias preconcepções e ouvir nossos corpos e a comunidade em que vivemos para procurar um jeito melhor – ou menos pior – de viver.
Quem faz isso já desistiu há tempos de esperar o endosso da grande mídia, do governo e da sociedade tradicional a produtos e escolhas como essas. Não nos sentimos representados por colunistas que deveriam falar a nossa língua e só conseguem audiência quando desfiam chauvinismos. Não conseguimos diálogo com a geração dos nossos pais, que não entendem porque precisamos verbalizar coisas tão desagradáveis como câncer de pulmão, sangue menstrual e... vaginas. Vemos esses mesmos pais baterem panelas ou xingar quem bate panelas com uma paixão que não mostraram na hora em que decidimos sair às ruas para os protestos de 2013 (ouvimos, na verdade, um “leva um casaquinho”).
Vejo uma geração cética, muitas vezes congelada na ataraxia (a serenidade da descrença), mas nunca deixando de questionar e ter esperança em caminhos, caminhos se possível melhores – no mínimo, menos piores. Uma coisa é visível: há cada vez menos inocentes, e o cara de pau que alega acreditar em dicotomias/dogmas e viver por eles é considerado imediatamente, por essa geração desconfiada, o menos inocente de todos.