21.12.09

Os pais não querem traumatizar os filhos dizendo não (ou não querem ter esse trabalho) ou impondo restrições - por exemplo, andai pelo shopping e verás pais distraídos batendo papo enquanto crianças barbarizam no degrau seguinte da escada rolante. Isso sempre existiu, mas antigamente, quando a mãe se dava conta, puxava a criança pela camisa para perto, morrendo de vergonha; hoje, você tem que reclamar para a mãe te dirigir um olhar de supremo desdém e continuar a conversa com a outra mãe - ou dizer casualmente "Pára, Paulinho" (sem ser ouvida nem obedecida), ou ainda "eu, hein, eles não tão fazendo nada".
Acho que estamos nos tornando um mundo de bananas, onde ninguém quer punir porque não tem colhões pra admitir que é capaz de fazer sofrer, e nem que frustração forma o caráter. Mas essa pirralhada sem limites cresce, e aí (depois de um ambiente escolar infernal) temos uma sociedade sem contrato, onde as pessoas fazem burradas primárias umas contra as outras e ninguém as pune por isso - e nem mesmo se afasta delas por isso. Mas em situações de confronto, um adulto babaquinha acaba ferindo outro adulto babaquinha onde dói. Resultado: os traumas são vividos com maior intensidade, só que na idade adulta. Aí o mundo da pessoa desaba e talvez alguém receite remedinhos para ela se sentir melhor. Tenho visto cada vez mais isso.

Comentário feito a isso aqui, aumentado para ficar com tamanho de post.

8.12.09

creeps me out

Sabe o que me dá arrepios? Sambas que antropomorfizam o samba - aqueles que fazem o ouvinte pensar no samba como uma pessoa. Por exemplo:
"Eu sou o samba/Sou natural aqui do Rio de Janeiro"
(em primeira pessoa!)
ou
"Quem nasce lá na Vila/Nem sequer vacila/Ao abraçar o samba"
ou
"É que o samba chegou agora"
ou
"Não deixa o samba morrer"
ou
"Disseram que o samba se perdeu/Onde será que ele está?"

Mas o campeão de creepiness é com certeza
"O samba ainda vai nascer/O samba ainda não chegou"
Como assim, um samba sobre a presente inexistência do samba? Lemniscata, dude.
Me dá um medo. Serinho. Como se não bastasse, quase todos eles (e outros) falam de uma tristeza enorme a reboque dessa tal pessoa-samba.
Felizmente, Rogério Skylab compartilha da minha estranheza, senão não teria criado essas duas pérolas:
"Não deixa não, o samba morrer/O samba chegou/o samba é você."
e
"O samba é totalmente nerd."

Com tudo isso, não faço a mínima questão e conhecer essa pessoa, seja lá quem ela realmente for.

3.12.09

"Quero coisas impossíveis, como toda mulher" (Dahmer)

A sorte de ser anormal é que você não passa pelas fases chatas de ideal masculino por que a maioria das meninas passa. Se apaixonar pelo amigo magro e sem pêlos que não intimida; depois pelo amigo gay, com ou sem pêlos; professor, homem mais velho, intelectual (yawn); na hora da revisão existencial, um framenguista doente ou fetichista; depois, já balzaquiana/quarentona, os novinhos. E variações em torno disso.
Sendo anormal você sabe exatamente o que quer, sempre soube, só que não existe. Você quer o impossível. Você quer um viking intelectual.
Até que, um belo dia, existe. E você fica achando: ecce homo, para quê o resto? Ficcionalmente falando acho muito chato, mas é bom de viver. Mão na roda.

Quando li Iracema, entendi a menina. Eu também era uma espécie de virgem vestal com prazo de validade e gosto exótico.