16.9.05

Vou ter que dizer. Sou (ou pareço ser) a única escritora atual que acredita em inspiração, torre de marfim, estas coisas. Claro que numa versão atualizada - explico.
Não acredito que algumas pessoas tenham a coisa e outras não, mas acredito que nem todas saibam ter, como um orgasmo.
Não acredito que seja uma visita súbita. É uma ideiazinha que vai se girando e encaixando no lugar - pense nas engrenagens de uma máquina -, vai se juntando com outras partículas de idéia, e aquele momento em que você percebe que tem uma boa idéia encorpada na mão, isso é inspiração.
Você pode guardá-la para mais tarde, fora da geladeira, por até alguns dias ou semanas, de forma a madurá-la melhor - bananas não amaduram na geladeira, ficam com gosto de verde, já percebeu? É só tirá-la de lá quando for sentar para trabalhar. Mas pra mim não adianta sentar para trabalhar sem uma dessas na cabeça. Nem que seja uma inspiração de tirar, do tipo "riscar aquele parágrafo todo".
Eu costumava querer me forçar a desacreditar na inspiração e, na época do No Shopping, sentava todo dia na frente do computador, mesmo sem vontade ou idéia. O resultado é que acabava fazendo besteira. Jogando fora coisas boas e acrescentando monstruosidades que depois, num dia mais lúcido e propício, eu lia e me arrependia.
Talvez, se um dia eu quiser me tornar profissional, eu trabalhe algum jeito de chegar lá - no trabalho cotidiano. Mas por enquanto, o que faço profissionalmente é traduzir, então continuo com o que funciona.