Eu mereço...
...por querer acreditar em cinema nacional. Por ter gasto preciosos cinco reais e uma hora e meia da minha vida para ver A Concepção. Eu mereço. Mea culpa mea culpa mea culpa.
É em Brasília. Tem uma orgia permanente num apartamento. Miraculosamente não tem uma cinza de cigarro no chão, uma pegada enlameada, sequer um delinqüente, um celerado, um facínora a sair do banheiro sem se enxugar; o assoalho recende a Poliflor Lavanda. Quem viu Os sonhadores sabe que apartamentos orgiásticos não ficam limpinhos e arrumados. Não, nunca se vê nenhuma empregada.
As pessoas sempre acordam completamente nuas (nunca meio-vestidas nem mesmo meio-cobertas) e numa disposição (que era pra ser) artística que já da primeira vez soa puramente forçada. Outra coisa: em Brasília, o ar seco provoca remelas monstruosas - o que não parece ser o caso de nossos higiênicos protagonistas, nem quando despertam em superclose.
Para entrar na bobice ideológica, é preciso explicar o que é a tal da concepção. É uma tentativa de "movimento artístico" cuja proposta é ser cada vez menos um indivíduo definido, assumindo a cada dia uma identidade (e cédula de identidade) nova. Que coisa... a mim me pareceu uma única identidade: a de riquinho mimado com físico de ator de Malhação. Teoricamente se podia fazer tudo, mas ninguém faz nada além de sexo e drogas. Ninguém escreve, trabalha ou se exalta a sério, é todo mundo muito polido (como o assoalho). Imagine fazer como em Clube da Luta e arrebentar aqueles rostinhos bem-hidratados, que horror? (Curioso! depois de certa altura do filme isso virou uma idéia fixa para mim.)
(Bônus para o trailer com declarações de Ziraldo e Chico Buarque - que causou giggles pré-adolescentes em todas as outras oito fêmeas do cinema (e em três machos) - ao som de Caminhando contra o vento.)