1.6.08

Teaser

Mas esse fim-de-semana, além de ficar na vagabundagem, trabalhei. Frio me inspira, deixa a mente alerta para aqueles retoquinhos finais, as decisões difíceis. Imprimi o Conto Japonês: Mousmé, dei uns últimos retoques, passei para o computador e mandei o arquivo pro editor. O conto está definitivamente pronto, eu diria pode mandar para as calandras se calandras ainda houvesse. Agora restam outros 15 contos pra selecionar, trabalhar e aguar até o Amostragem complexa estar pronto. Mas fiquem com um trechinho inédito deste primeiro a sair do forno:

- Por que esta cara? Não entendo essa sua cara!
Este senhor não é o meu professor de biologia, é o de outra turma. Ele dá a aula de reforço oferecida pelo próprio colégio. Está me passando um sermão cujo objeto todos, inclusive ele, estão sentindo dificuldade em determinar.
- Eu não presto atenção, professor?
- Você presta atenção! Não é isso! É que... Eu só queria saber o que... porque a senhorita trata a minha aula com esse... É um, um desdém! Uma... nonchalance!
Parabéns, você acaba de usar “nonchalance” numa sala de aula no ano 2000. Por minha causa.


(...)

Você lê história e alguns livros e já sabe como fazer tudo certo. Não cair na lábia de canalhas com Anna Karenina, não emprestar nem tomar emprestado com Shakespeare, não ser totalitário com Orwell e assim por diante. Só que iluminismo não adianta se todos correm de volta pro escuro.
Você sabe as coisas sem ter, ao menos uma vez, pensado que sabia. Você não consegue nem começar a pensar em se entregar à doce burrice. Lucidez férrea é puro horror.


(...)

Dia seguinte, mesma hora e lugar, um dedo lhe inseriu um bilhete suado na concha da mão. Soltava pelicos de papel e era escrito a lápis.
Compareceu. Foi ao encontro marcado.
- Eu te fiz um poema.
Esta porção de palavras era a que ela mais temia ouvir na vida. Quer dizer, temia com expectativa, porque era inevitável, alguma hora, alguém... eu-te-fiz-um-poema. Esse tipo de disparo. Mas será que ia ser ruim? Quanto ruim?
- Por quê?
- Leia o poema que você vai saber.
Para quem ruim?
- Você tem certeza que quer me mostrar isso?
William prendeu a respiração. “Tenho”.


O que eu mais tenho orgulho nesse conto é que as cenas não se esgotam numa frasezinha esperta (como às vezes em No shopping), mas dão o máximo de si até se encadearem bem na próxima. Todas essas cenas acima têm sua conclusão, que ocultei porque afinal isso é um teaser. Are you teased?