5.3.05

Quando voltei, me perguntei quem era o homem na minha frente. Aliás, onde é que eu estava.
O estranho me contava a parte da minha vida que eu tinha perdido.
Seus lábios estavam brancos, dizia ele. Como a palma da mão.
Tive que abrir sua boca, você trincou os dentes e estava enrolando a língua.
Quase um poema de Augusto dos Anjos.
Respira. Tira os óculos.
Se não tivesse alguém preparado na hora... (reticências perigosas)
Porque você não avisou que desmaiava quando tirava sangue?
The thing is, eu avisei. Mas avisei calmamente: eu sempre desmaio quando tiro sangue. Resignada, olhando para a frente. Fazer o quê? Hoje é dia de tirar sangue, é dia também de desmaiar.
Ele tinha que tirar cinco tubos. E eu fui contando. Um. Dois. Três. Ei, até agora tudo bem. Aí a vista escureceu. Ele colocava o quarto, e avisei sorrindo: eu vou desmaiar. Respira fundo. Enche de ar o pulmão. Obedeci. Agüentei até o final do quinto. Olhei para o lado, os cinco tubos cheios sobre um estrado de metal branquinho, e o homem parava o sangue do braço com um algodão. E pensei, que ótimo, desta vez consegui me afastar da aflição da agulha e do sangue saindo de mim. Então pensei: merda, porque me sinto assim então? E concluí que não era a frescura, a frescura só acelera o processo. Desmaio é por causa da tiração de sangue em si. Então desmaiei.
Eu aviso. Mas as pessoas acham que não estou falando sério. Como quando eu digo que tenho consciência de que vou morrer um dia. Acham que estou brincando.