19.2.05

Estive em outros lugares e descobri que os rituais são diferentes. E não vou falar só dos melhores. Os EUA por exemplo.
Estive lá com 13 anos, e na Disney, mas isso não importa, na verdade. Lá a paquera é uma fuga de Deus, uma pulada de cerca pra pecar. Você tem que pular num pé só e fazer figa enquanto paquera, e depois se confessar direitinho. Pelo menos a impressão que eu tive foi essa.
Um dia estava esperando pessoas na porta de uma lanchonete medieval dentro de um parque temático. Eu usava um short de florzinhas e uma blusa verde-limão. De repente,
- Hey.
um jovem desenhista meio ruivo ainda com algumas espinhas (enquanto eu, "já" com algumas espinhas), desses contratados para ficar desenhando as pessoas do parque.Ele pergunta: how old are you. E eu, atravessando o fonema com um sotaque latino: "sirteen."
Pergunta se pode fazer um retrato de mim, quase sussurrando. Respondo que já tenho um retrato.
Ele olha de um lado e de outro. Tio Walt não está à vista.
- You are very beautiful.- "Sanks."
Não é a toa que Lolita se passa na América, não senhores.

Em Londres, a paquera tem um toque gentleman que acho perfeito. Acho que já contei essa história mais abaixo - estou virando uma velha. Um lixeiro-gentleman se aproximou e disse que me via passar todo dia e estava apaixonado. Me deixou lisonjeada. Foi um gesto lindo. Me fez olhar pra ele e avaliar a possibilidade - por um segundo. Não, não fiquei com ele. Mas sorri o máximo que pude na minha recusa.
E o italiano que era o próprio Angel da Buffy com olhos claros e dançou o tema de Grease comigo na boate da Leicester Square. Ele conseguiu não ser rude, e isso sem falar uma palavra de inglês, nem eu de italiano.
Em compensação, o todo da paquera e do sexo em Londres é meio esquizofrênico. Há aparentes patetas que são Jacks-estripadores em potencial (outra história, terrível, que está aí embaixo em algum lugar).

Aqui:
Estou num ônibus pela cidade, olhando pela janela. Tenho, de repente, a sensação nítida de uma energia muito ruim focada na minha direção (sei que isso parece espírita ou coisa assim, mas de fato a Senhora Sensível aqui tem essa sensibilidade). Encontro um homem gordo e nojento no banco oposto me olhando as pernas, e quando eu viro, ele me olha nos olhos. Sustento o olhar, mas ele não desvia. Pergunto alto:
- O que você está olhando?
Ele esperava tudo, menos aquilo. Surpreso, no início só consegue responder:
- EU?
- Sim. Você. Perdeu alguma coisa aqui?
Todos no ônibus olham para ele. Intimidação se paga com intimidação.
- EU? Olhando para VOCÊ? Há! Eu estava mas é olhando pro meu amigo, ali do outro lado da rua, na vila.
(Acontece que a tal vila já passou faz tempo, e olha que estamos num engarrafamento. Ele devia era ter começado a encarar depois disso).
- Não. Você estava olhando para a MINHA PERNA.
- Ih, se acha a gostosa, ela! Imagina se EU ia olhar pruma perna BRANCA dessas! Vai pegar um sol, garota. Êêêê...
Renuncio a perguntar como é que ele sabe que minha perna é branquela se não estava olhando. Todos, pelo menos os minimamente inteligentes, já o olham com uma ligeira sobrancelha erguida. Ele não percebe e continua sua ladainha. Volto a olhar a paisagem.

Bah, melhor que paquera é flerte. Quem sabe, sabe. E é praticamente igual em todo o mundo.