28.4.05

que deus lá me perdoe

Eu sinto que acabei de fazer, não, eu cometi um troço antinatural. Eu fui contra a natureza. Tive que pegar o meu jeito de escrever, pervertê-lo, deformá-lo, colocar seus pés em sapatos de ferro tamanho 32 para que ele fosse fala-de-santo. E não minha. Sei lá porque fui me prometer de escrever o que tenho que escrever, em vez de escrever o que dava. Enfiei na cabeça que tinha uma missão e agora.estou.escrevendo.desta.maneira diário-de-Anne-Frank-em-tradução-portuguesa (quando eu comecei meu segundo ou terceiro diário, eu escrevia copiando o estilo da tradução portuguesa de Anne Frank - não me perguntem porquê).
Tenho que me controlar pra não abusar de mesóclises. Para não dizer "tenho de" em vez de "tenho que". E para não dizer "para", mas "pra".
Oh.
Se não se muda a experiência, deixa-se de ser experimental. (Deixa-se de ser, argh.)
Sinto-me com o toque de Midas... (Me sinto! Me sinto!)

Eu escrevia desse jeito, fluidamente, aos 11 anos de idade (com 11 anos eu calçava 35). Não estou brincando. Com 11 anos eu poderia ter sido um best-seller, se tivesse escrito as cenas que um Dan Brown me psicografasse - meu problema sempre foi colar o enredo. Eu tinha ótimas idéias... isoladas. Então, meu estilo foi-se deteriorando de vez ("tá crescendo e tá ficando boba", ditava vovó). Era um verdadeiro Mal de Alzheimer do estilo. Encontrar algo para ler se tornava cada vez mais difícil, pra escrever nem se fala. Só comecei a retomar o fio da meada com Fernando Sabino e Clarice Lispector.
Quando as coisas pararam de ter que fazer sentido, ficou fácil escrever. Aí - how cute - escrevi.
Ah, mas sobre o quê "importa" escrever? Aonde você vai com isso, mocinha?
É, mocinha.
É por isso que me embolo. Meus livros serão sempre tentativas de me desembaraçar deles mesmos. Já pensou?
Claro que esse não será um best-seller, a não ser que a Igreja Católica implique oficialmente com as referências a santos, ou as pessoas se empolguem com as perversões sugeridas ("sexo! sexo! sexo!", bradou o garoto ao descobrir o nome do critério de separação dos banheiros da escola), ou ainda se resolverem me acusar de anti-carioca e difamadora branca-azeda - ei, olha só, não é que tá voltando?