21.12.09

Os pais não querem traumatizar os filhos dizendo não (ou não querem ter esse trabalho) ou impondo restrições - por exemplo, andai pelo shopping e verás pais distraídos batendo papo enquanto crianças barbarizam no degrau seguinte da escada rolante. Isso sempre existiu, mas antigamente, quando a mãe se dava conta, puxava a criança pela camisa para perto, morrendo de vergonha; hoje, você tem que reclamar para a mãe te dirigir um olhar de supremo desdém e continuar a conversa com a outra mãe - ou dizer casualmente "Pára, Paulinho" (sem ser ouvida nem obedecida), ou ainda "eu, hein, eles não tão fazendo nada".
Acho que estamos nos tornando um mundo de bananas, onde ninguém quer punir porque não tem colhões pra admitir que é capaz de fazer sofrer, e nem que frustração forma o caráter. Mas essa pirralhada sem limites cresce, e aí (depois de um ambiente escolar infernal) temos uma sociedade sem contrato, onde as pessoas fazem burradas primárias umas contra as outras e ninguém as pune por isso - e nem mesmo se afasta delas por isso. Mas em situações de confronto, um adulto babaquinha acaba ferindo outro adulto babaquinha onde dói. Resultado: os traumas são vividos com maior intensidade, só que na idade adulta. Aí o mundo da pessoa desaba e talvez alguém receite remedinhos para ela se sentir melhor. Tenho visto cada vez mais isso.

Comentário feito a isso aqui, aumentado para ficar com tamanho de post.

8.12.09

creeps me out

Sabe o que me dá arrepios? Sambas que antropomorfizam o samba - aqueles que fazem o ouvinte pensar no samba como uma pessoa. Por exemplo:
"Eu sou o samba/Sou natural aqui do Rio de Janeiro"
(em primeira pessoa!)
ou
"Quem nasce lá na Vila/Nem sequer vacila/Ao abraçar o samba"
ou
"É que o samba chegou agora"
ou
"Não deixa o samba morrer"
ou
"Disseram que o samba se perdeu/Onde será que ele está?"

Mas o campeão de creepiness é com certeza
"O samba ainda vai nascer/O samba ainda não chegou"
Como assim, um samba sobre a presente inexistência do samba? Lemniscata, dude.
Me dá um medo. Serinho. Como se não bastasse, quase todos eles (e outros) falam de uma tristeza enorme a reboque dessa tal pessoa-samba.
Felizmente, Rogério Skylab compartilha da minha estranheza, senão não teria criado essas duas pérolas:
"Não deixa não, o samba morrer/O samba chegou/o samba é você."
e
"O samba é totalmente nerd."

Com tudo isso, não faço a mínima questão e conhecer essa pessoa, seja lá quem ela realmente for.

3.12.09

"Quero coisas impossíveis, como toda mulher" (Dahmer)

A sorte de ser anormal é que você não passa pelas fases chatas de ideal masculino por que a maioria das meninas passa. Se apaixonar pelo amigo magro e sem pêlos que não intimida; depois pelo amigo gay, com ou sem pêlos; professor, homem mais velho, intelectual (yawn); na hora da revisão existencial, um framenguista doente ou fetichista; depois, já balzaquiana/quarentona, os novinhos. E variações em torno disso.
Sendo anormal você sabe exatamente o que quer, sempre soube, só que não existe. Você quer o impossível. Você quer um viking intelectual.
Até que, um belo dia, existe. E você fica achando: ecce homo, para quê o resto? Ficcionalmente falando acho muito chato, mas é bom de viver. Mão na roda.

Quando li Iracema, entendi a menina. Eu também era uma espécie de virgem vestal com prazo de validade e gosto exótico.

25.11.09

Emília

O personagem moralmente reprovável, mas irresistível, é um recurso usado pela literatura do mundo todo, mas no Brasil ele vira uma pedra angular. Basta pensar em Nelson Rodrigues - que, pelo óbvio ululante, nem vou desenvolver - e em Monteiro Lobato. De que seria sua obra infantil sem Emília? E, no entanto, é uma bonequinha egoísta, ambiciosa, arrivista, preconceituosa, orgulhosa etc. etc. etc. "São esses os valores que queremos ensinar aos nossos filhos?" Vocês eu não sei, mas eu não encaro livro só como exemplo direto de comportamento; pode ser só ficção, gostoso de ler; pode ser anti-exemplo; pode ser que a criança imite a Emília um tempo, nos aspectos bonitinhos. Mas não é só isso: Emília é eminentemente brasileira, só que sem hipocrisia.
Isso funciona como a violência catártica dos contos de fada: viver aquilo por procuração conta como experiência. Vendo o mal sem disfarces, a criança aprende a distinguir suas formas mais tênues, hoje tão em voga. Proibir qualquer coisa que remotamente cheire a mal parece com superproteção, mas na verdade desprotege a criança contra um mundo cheio dele, e, se ela nasceu com um talento especial para o mal, certamente isso não impedirá que ela o aproveite. Hoje em dia as pessoas não são mais reprimidas - também acho desnecessário desenvolver -, ou melhor, só se reprimem quando acham que vai pegar mal. As pessoas também não se manifestam/defendem/apartam dos linchadores de inocentes ao verem algo reprovável só porque têm medo de serem excluídas. Oras, até pela bunda-molice onipresente, ninguém vai ter peito pra te excluir só porque você falou a verdade. É capaz até de começarem a gostar de você. Vai fundo!
Isso aprendi com a Emília e o JP.
Ah, a propósito: carioca É porco.

12.11.09

O meu problema é que nunca consegui ser muito brasileira. Sou inglesa demais (ou oriental, preferem alguns). Por algum motivo, as coisas de que os outros brasileiros gostam me deprimem.
Concurso público: brasileiros acham ótima a estabilidade no emprego. Eu acho o quê?? Sísifo pelo menos fazia um pouco de exercício e ficava ao ar livre.
Ser cantada na rua: brasileiros acham que todo mundo ganha: o rapaz, que exerce sua masculinidade de forma saudável e vê uma forma bonita, e a moça, que tem sua auto-estima reforçada. Eu acho que o rapaz é um bronco em não ver que meu caso é diferente e que, se auto-estima precisa de um pedreiro pra funcionar, simata de uma vez.
Jogo de futebol: brasileiros acham divertido gritar MENGOOO! PORRA! e soltar fogos pela janela à meia-noite. Fico tentada a soltar fogos durante jogos não-tradicionais, seja no fuso horário que for, para ver se não incomoda mesmo. Fórmula 1. Tênis. Lacrosse.
Permissividade: brasileiros toleram comportamentos tipo chegar tarde, aumentam a nota "uns pontinhos", dão "um jeitinho" e uma "passadinha" na festa. Lá pelos meus seis anos, exigi a abolição do diminutivo da língua portuguesa - ou pelo menos do trato comigo - em parte por causa disso.
Birita: brasileiro acha que beber é subversivo e revolucionário. Eu acho OK beber, até cair se você achar necessário (gloriosa Escócia!), mas essa mentalidade é extremamente adolescente. Soltar elucubrações sobre as marcas que você bebe ou como beber é bom ou contar seu coma alcoólico não vai me impressionar. Você é Baco? Noé? Inventou o vinho? Então não é original já faz uns milênios. Calaboca.

Barulho demais, desordem demais, falta de cultura demais. Gosto de chá. Não gosto de hipocrisia. Lassidão e baderna, só nos horários e locais predeterminados com pessoal autorizado, e aí me entrego com gosto; de resto, no loitering.
Pelo menos não posso reclamar da falta de material literário.

11.11.09

É o calor sim

Hoje tomei uma decisão. Passei os arquivos de trabalho para o laptop e me tranquei no quarto com ar-condicionado. Me rendi porque o trabalho não estava rendendo nada nesse calor nublado e pegajoso que é muito pior que sol aberto. Adivinha se aqui não estou pensando muito melhor - muito mais rápida e claramente - e produzindo que é uma beleza.
Só fico pensando em quantos professores de Ensino Médio não advogavam aquela ideia de que o clima tropical úmido não tem nada a ver com brasileiro não gostar de trabalhar. E em quantos não tentaram instilar que brasileiro é um povo trabalhador, nada preguiçoso, que Macunaíma é um ultraje etc. etc. etc. Sei. Ainda estou para ver um deles topar corrigir prova no meio da Mata Atlântica. E, pela minha curta experiência em escritório, brasileiro é um povo que fica no trabalho muito tempo - até ganhando hora extra - sem necessariamente trabalhar. Isso em uma empresa privada. No serviço público, nem se fala.

9.11.09

Na companhia de babacas

Sobre a Uniban e gostosas tentando se ilustrar, pensei o seguinte:

Quando eu tinha 13 anos e, da noite pro dia, fiquei gostosa, considerei mentalmente esta nova opção: entretenimento adulto. Até então, eu parecia destinada a ser nerd, mas naquele ponto poderia escolher entre uma carreira de nerd e uma carreira de gostosa.
Não suportava ter que ser interessante para a massa. Se eu fosse tentar a carreira bas-fond, certamente eu miraria nos generais, não nos soldados (Dietrich mode on). MAS...
O ponto decisivo para continuar investindo (pondo os XP points) na nerdice foi a companhia. Eu detestava os zé-punhetas da minha sala. Agora, imagine uma profissão que transforma homens crescidos em babões de 13 anos, tenham a inteligência ou a posição social que tiverem. No fundo foi por isso que desisti da carreira no entretenimento adulto em favor da nerdice, e não por um motivo moral mais elevado (e certamente não pelas recompensas financeiras, heh).
Acontece que o buraco é mais embaixo. O macho brasileiro ainda não trabalha nas duas fases, mulher bonita E inteligente. Resultado: há intelectuais que conversam muito direitinho com outros portadores de pênis, mas quando uma menina bonita entra no palco, só usam a gente como escada-zorra-total. Numa metáfora voleibolística: não levantam a bola para a gente cortar, ressentidos como Irmãs Cajazeiras. Talvez porque aquelas ali não caiam fácil na lábia.

29.10.09

Tulipas

Arregimentados meus primos, comecei a combinar como seria a peça. O palco seria o chão da casa demolida. O barraquinho de ferramentas seria nosso camarim. Separamos apetrechos como jornal, cadeira, enxada etc. Carregamos as cadeiras da cozinha para o antigo pórtico. Roubamos uma corda do varal para ser a cortina, além de um par de lençóis já sujos. Cobramos 100 caraminguás (quem lembra a moeda de 1991?) dos adultos, que se sentaram com cara de expectativa sob o arco da casa demolida.
O primeiro ato correu às mil maravilhas. Representamos sob a minha direção. O final não estava combinado, mas eu não tinha peias de recorrer a um deus ex machina caso necessário. Conseguimos segurar a atenção dos irrequietos adultos. Fomos aplaudidos.
O segundo ato correu um pouco pior, com murmúrios da plateia. E faltava eu definir como seria o final. Eu hesitei, enquanto a assistência reclamava da demora. Mandei servir o refresco.
Meu primo menor estava com uma cara insatisfeita, e, no intervalo, decretou que, no próximo ato, faríamos o seguinte: ele começaria sozinho no palco, sentado, lendo um jornal, quando se depararia com a notícia de que seu filho foi sequestrado (cena que reconheci imediatamente como inspirada no início de um episódio de Chaves, além de dramaticamente implausível). Tentei protestar: a peça não era sobre isso; não tinha nada a ver com o que tinha sido feito antes; ele replicou que, do jeito que estava, "tava muito chato". A cortina se abriu, ele fez o que tinha inventado à revelia e depois começou a improvisar com seu irmão, que falava para dentro e rápido; as pessoas da plateia começaram a conversar. Eu desisti, deprimida.

Hoje, sob a casa demolida, plantei tulipas. Apenas a branca floresceu uma vez, repolhuda e nada parecida com uma tulipa. Margot Tenenbaum e Briony também são impossíveis em solo nacional.
Quando eu era pequena, era sujeita a longas ausências, inclusive enquanto falava com outras pessoas, adultas ou não, em que meu olho parava em algum detalhe inócuo e lá permanecia por cerca de 30 segundos a 2 minutos. Era como se meu cérebro estivesse cansado - não cansado-sem-energia, mas cansado do esforço específico da comunicação interpessoal, que pra mim sempre foi muito difícil.
Logo notei que as ausências não aconteciam somente quando eu estava acompanhada. Às vezes eu estava assistindo televisão, ou simplesmente contemplando a tardinha cair e os detalhes da sala mudarem de cor à medida que isso acontecia, quando, de repente, eu perdia a fixação na realidade objetiva. Eu me sintonizava em outra onda. Quando voltava, percebia estar mirando fixamente a treliça da sala, que, de tão intensamente perscrutada, revelava uma profundidade 3D. Hoje isso acontece com a Montanha.
Hoje isso acontece na rua.

A capacidade intelectual aumentou. Prefiro escolher companhias com quem me comunique em um nível mais profundo (profundo talvez não seja a palavra, mas não sei de melhor) e possa falar como se estivesse tratando comigo mesma. A essas pessoas pareço muito inteligente. Às demais, pareço retardada, aparvalhada, doente, enigmática, hermética, essas coisas. Daqui, parece-me que sou sempre bem clara.

20.10.09

filme de terror: La Lama

Acaba de sair o número um da revista Lama, em que entrei com O Aleph de Botafogo. Ficou um conto bem light, exceto por ter aberto uma exceção para mim bem violenta: me usar como personagem. Quem acompanha isso aqui deve ter noção de como isso me aterroriza. Felizmente, minha insânia não foi tão longe: tudo o que acontece no conto é pura lorota. Fiz até um vídeo para elucidar:

12.10.09

negentropia

Todo o contato prematuro e próximo que tive com o mal, e mais do que com o mal, com a entropia e como a sociedade a trata, me faz considerar certos temas em literatura chatíssimos. Quanta frioleira! Eu quero a verdade. Eu quero o que é real. Por isso mesmo sou fã de ficção. O trabalho de mentir para realçar a realidade vem sido substituído por falar a verdade para melhor mentir, o que explica tanta autobiografia fuleira.

A proximidade da entropia tolerada com a encarcerável é que me arrepia. As coisas se estragam e pouca gente se dispõe a cuidar delas. Preferem criar coisas novas do zero e abandonar o que ainda amam do que revivê-lo - dá trabalho consertar. Uma criança, por exemplo. Ou uma cidade.

Você já parou de andar com alguém porque a pessoa ofendeu uma convicção fundamental sua? Aqui no Rio simplesmente não se usa isso... pelo menos eu nunca vi. Sorri-se e vai em frente. No meu caso, sou incapaz de fazer esse tipo de coisa porque não lembro do nome e da cara das pessoas. Mas faria, faria.

9.10.09

Caixa de ferramentas para quem trabalha com texto

1 - Dicionário de ideias afins, do Sargentim (há outro em português?)

A principal diferença do dicionário de ideias afins para um de sinônimos é que sua interface é gráfica, intuitiva, hipertextual - bom pra ratos de internet como eu. Sabe aquela palavra que está na ponta da língua, mas não vem? E aquela que você acha que quase exprime o que você pretende, mas suspeita que exista um termo mais preciso? Munido desse livro, fica mais fácil de achar.
Outras diferenças para o dicionário de sinônimos são a inclusão de expressões longas (como "sair do ventre materno" para "vida") e o agrupamento de substantivos, verbos e adjetivos na mesma entrada.

Como não se machucar com essa ferramenta: muitas vezes a expressão sugerida pode ser lugar-comum. Use o bom-senso.

Não sei porque protelei tanto para comprar um. Talvez porque seja uma ferramenta pequena, fácil de sumir nas prateleiras da livraria, que muitas vezes nem pede sua reposição...

2 - Dicionário de sinônimos e antônimos. Gosto do Houaiss e do velho Francisco Fernandes
Dicionários de sinônimos são ótimos para escritores e tradutores que sabem usá-los, especialmente em conjunto com outras ferramentas. Folheá-lo à toa pode render uma ideia ou texto. Pessoas com pouco RAM, como eu, têm uma série de significados armazenados no fundo do cérebro que um dicionário como esse vem resgatar.

Como não se machucar com essa ferramenta: Não floreie o texto quando desnecessário. Menos pode ser mais. Vamos colocar assim: o Word tem muitas fontes, mas não é por isso que você tem que usar Matura Script ou Comic Sans, entende? (Mas considere usar uma Wingdings eventualmente.)

3 - Dicionário eletrônico. Gosto do Aurélio e do Houaiss.
Por que eletrônico? Se tem uma coisa que fica melhor digitalizada, é livro de referência. No caso dos dicionários, é bem mais fácil consultar uma palavra sem perder o fio da meada. Com alguns cliques a mais, você pode consultar outras grafias, derivados e sinônimos - ainda sem perder o fio da meada.
O Aurélio é mais objetivo, idiossincrático e politicamente incorreto, o que me agrada. Dê uma olhada na lista de sinônimos para "morrer", por exemplo.
O Houaiss tem TUDO. Mas cada entrada tem informação demais. Você pode se perder naquele mar interessantíssimo de informações e esquecer do seu texto.

Como não se machucar com essa ferramenta: Frisei bastante a questão de não perder o fio da meada, não é? Pois é, dependendo do texto, você deve se permitir navegar à toa no mar de informação excessiva.

8.10.09

Escrevo um livro muito diferente do outro. Acho que essa irregularidade deixa as pessoas coçando a cabeça, e ninguém tem coragem de, digamos, me contratar. Como vender feito grife um autor que pretende começar do zero a cada obra? Novo tema, nova ambientação, nova estrutura, nova métrica... deve ter gente desconfiando que Simone Campos é pseudônimo de um coletivo de autores.
Pelo menos me esforço para manter ou até ampliar a qualidade. Agora, pelo menos por um bom tempo não vou ser nenhum Stephen King - em fórmulas ou em vendas.
O próximo também não se parece com nenhum dos anteriores - é na internet, como Penados y Rebeldes, mas... quanta diferença.

28.9.09

Chutando cachorro morto

Não acho graça nesses textos que tentam fazer perfil esculachador de classe média. Sério, que engraçado!, dizer que a classe-média-é-medíocre-porque-assiste-novela-das-8 - original também. Que coisa, conheço uma favelada e um filho de dono de cartão de crédito preto que também são doidos por novela... têm Orkut, gostam da Disney etc. etc. Na verdade, conheço até gente inteligente que gosta de algumas dessas coisas. E sempre zoo (zôo? lógico.) elas por isso.
Portanto, nada contra zoar as pessoas por gostarem de novela, mas associar isso sempre a classe média é humor com fundo político, e acho blé. Separar classezinha social pra bater, seja qual for (lumpenproletariat, por exemplo), pra mim é ranço de esquerda dos piores.
As coisas que essas listas apontam não são privilégio de classe. São problemas do Brasil e até, ouso dizer, da condição humana. Acho que bater na classe média por isso é só um jeito de ser condescendente com pobre e demonstrar temor de rico (ou medo de parecer ressentido com rico).

27.9.09

O Ismar Tirelli fez essa entrevista comigo um tempo atrás e postei-a em todo lugar, menos aqui. Ele soube extrair o melhor de mim:

- Não quero praticar bukkake com o leitor (“fica aí, paradinho. Isso.”).
- sobre a relação não-predatória entre vivência e escrita.

- A lan house é o novo rendez-vous. Eu simplesmente tenho que aproveitar isso. Pretendo plantar um vírus que transforme a lan house em biblioteca. - sobre meus projetos futuros.

Vão lá no Portal Literal e confiram como um entrevistador talentoso rende um bom entrevistado.

20.9.09

AMANHÃ, no Bar Balcão, lançamento do meu Amostragem complexa em São Paulo. 19h. Rua Dr. Melo Alves 150 - Jardim Paulista. Fico ali até umas 22h pelo menos. Espero vocês.

17.9.09

coisas que só acontecem na ECo

Ah, a minha faculdade. Passei muito tempo sem ir lá. Tempo demais.
Quantas vezes não caí pra trás de abizarramento naquela faculdade? Só para se ter uma ideia:
Um dia, entrei na xerox, falando animadamente sobre Chaves com uma amiga quando percebi uma menina idêntica à Chiquinha ao meu lado. Idêntica. Eu estava saboreando a coincidência quando Chiquinha-Lama, sorrindo, interferiu: meu ex também é obcecado por Chaves.
- Dá licença, mas eu acho que ele namorava com você porque você é igual à Chiquinha.
(minha amiga disse que eu fui sincera demais)
- Eu sei! É por isso que o site dele sobre Chaves se chama Danizinha.org!
- VOCÊ que é a DANIZINHA ponto org?
Site este que eu tinha conhecido no dia anterior - um dos maiores sobre Chaves no Brasil.
Só na ECo mesmo.
Me vejo como uma grande aliada do português, até quando ele não precisa e não quer ser defendido. Imagine que zelo pela beleza e expressão das frases até em folheto de equipamentos petrolíferos. Gosto que esse tipo de material seja o mais inteligível possível, sem aqueles cabedais de "de" e "ão" que os tradutores preguiçosos costumam fabricar. Nada de "Ampliação da valvulação da pressão". Nada de "escopo crítico". Na minha mão, "scope" é "âmbito" e "critical" é "crucial". (Às vezes, isso faz você perceber como o texto original não faz qualquer sentido, mas isso é outra história.)
Para defender o meu idioma, claro, tenho que conhecer bem o(s) outro(s). No caminho, me encanto por suas belezas (quando há) e peculiaridades (sempre há). O fato de eu aprender, me encantar e desfrutar de outro idioma, paradoxalmente, me torna melhor conhecedora e aliada do meu.
Paradoxo e ambiguidade, como sempre, são coisas que deixam certas pessoas aflitinhas. Na cabeça deles, servir a pátria deve ser se ensimesmar ao máximo, algo do nível tampar os ouvidos e fazer lálálá. Vejo que não são totalmente incapazes, mas me exaspera quererem me "acusar" de pretensiosa (pra mim não é acusação: de fato eu "pretendo" coisas) quando eles são tão obviamente cheios de si; e de "culturalmente colonizada", quando usam jargão dum ideário petrificado, em vez de ler as fontes e aplicá-lo aos tempos que correm.

Mudando de assunto, mas não muito: hoje, na faculdade, vi uma banquinha vendendo ímãs de geladeira do Marx (PlayMobil) e de outros pensadores. Eu queria o do Deleuze, mas não tinha; quase comprei o do Baudrillard. Mas tinha muitos espaços vazios. Aposto que o do Sartre acabou primeiro, >yawn<. É que o Sartre equivale a dizer: "sou feio, mas passo o rodo". Sim, tá bom.

3.9.09

ponto de inflexão

"Há uma oportunidade rara que se oferece que é como uma tábua entre dois navios. Você é confrontado com uma situação que vai estritamente contra todos os seus princípios; nesta situação, e somente nesta situação, você recebe o dom de abandonar todos eles. Claro que para a mágica acontecer é imprescindível estar situado num turning point."

Trecho de A feia noite (2006)

Será pecado se enamorar tanto do próprio livro? Parece incestuoso. Sei que trechos dele vêm na minha cabeça o tempo todo, e sinto uma compulsão de citá-lo frequentemente.

Maria Luiza, dona dessa frase, é filha de uma ex-umbandista que encontrou... o marketing ("largou os trabalhos pelo trabalho"). Quando leio o termo marqueteiro "turning point" ou "ponto de inflexão" esse trecho sempre vem na minha cabeça.

31.8.09

empiricismo ofensivo

Então - deu vontade de falar agora do meu método empírico.
Quando eu tinha 23 anos, passei um tempo desempregada. Estava terminando jornalismo e resolvi tentar uma bolsa de mestrado*. Para isso, antes eu precisava passar no mestrado. OK, pensei, vamos lá. Li a bibliografia chatinha deles (financiada por papá e mamã) e me preparei para a prova - primeira fase do proceffo ffeletivo (entonação lulesca aqui, por favor).
Levei um livro a mais no dia da prova - um sobre teoria do caos que eu tinha lido antes de começar a faculdade porque me chamou a atenção numa livraria e estava barato. Já estava todo marcado e iluminado mesmo...
Dentre as opções de questão, tinha uma citando Baudrillard e eu fiz a maluca com meu livrinho extraclasse. Pensei, acho que eles vão gostar.
Gostaram. Tirei, sei lá, 8 e passei pra fase seguinte. Apresentação do projeto e currículo. Chato.
Eu tinha uma ideia de execução bem chatinha, mas legal: falar de operador de telemarketing como "boca alugada" pelas corporações, em contraponto à história do pregoeiro que tinha seus próprios bordões criativos. Me pareceu esquerdista o suficiente e fui em frente. Redigi a coisa, passei na Biblioteca Nacional, pesquisei as referências que tinha encontrado. Deu trabalho. Eles pediam introdução mais alguma coisa, não lembro o quê. Um dia antes do prazo fechar, a impressora deu defeito; imprimi na casa do meu namorado, acho. Entreguei.
Alguns dias depois, saiu a resposta - eu tinha passado para a fase final. Entrevista com a banca de três.
Eu fico muito mais intimidada com processos impessoais do que com pessoais. Na verdade, sinto muito mais respeito por processos impessoais. Cara a cara, eu sinto segurança de que não posso ser acusada de burra - talvez de confusa, distraída e sem postura, porque sou mesmo. Mas burra não.
Aí cheguei lá no dia, fiquei esperando chegar a minha vez. Todos os candidatos se conheciam, eu não conhecia ninguém. Ficar ouvindo a ladainha deles ia me deixar nervosa (overthinking), então me afastei depois de ser socialmente simpática.
Entrei. Na banca tinha dois professores de quem eu só tinha ouvido falar e uma que nem isso. Distribuí o recém-saído A feia noite para eles, fiz uma apresentação, e esperei as perguntas.
A professora L., de quem eu tinha ouvido falar, falou muito bem da prova que eu tinha feito, elogiou minhas colocações, o lance do caos. Depois elogiou o projeto.
A professora X., de quem eu nunca ouvi falar até hoje, foi tão neutra que logo vi que ela nem tinha lido nada, mas também não tinha nada contra mim.
O professor M., de quem eu já tinha ouvido falar mal, começou assim:
- Estou vendo uma inflexão tão preconceituosa aqui, aqui e aqui. O que você tem contra pedintes de ônibus?** Então eu quero saber só isso: de onde você tirou esses dados para essa introdução. Eu queria saber que... que método você usou para essa pesquisa. Que método?
- Empírico.
(Silêncio de cinco segundos, eu olhando no olho dele plácida. Professora L. se mexe na cadeira.)
Então expliquei que a pesquisa ainda não tinha sido feita, porque eu ainda não tinha passado para o curso do mestrado. Ao longo do mestrado é que se faz a pesquisa completa, e aí eu teria a chance de modificar a minha introdução e a minha hipótese. (Sorriso conciliador.)
O homem espumou de raiva. Sério mesmo. Juntou bolhinha no canto do lábio. Ele largou o osso enquanto professora L. tentava pôr panos quentes me elogiando um pouco mais. Mas eu sabia que ele logo voltaria à carga. O que eu não esperava é que fosse tão canhestramente.
- Como é que você pode nos apresentar uma introdução nessas condições?
- Eu concordo com você, mas o edital de vocês pede a introdução primeiro. O que eu entendi (e dei uma olhadinha para as professoras L. e M. enquanto isso) foi que vocês só queriam ter uma ideia da nossa capacidade de desenvolvimento e pensamento, não que já fôssemos ser avaliados agora pela capacidade de pesquisa... Inclusive, quando terminei a graduação por essa mesma escola (outra olhadinha para as duas), a professora R. de jornalismo, em Projeto Experimental I, disse que a introdução era a última coisa depois da pesquisa.
- Eu não quero saber o que os imbecis do jornalismo lhe ensinaram!!! (discreto sshhh! da professora L. tocando-lhe no braço) E blá blá blá...**
Quando saí, a professora L. elogiou meu capacete de bicicleta.
- Oh, isso? Não sabia que contava. Não é nada ativista não, venho de bicicleta por preguiça mesmo.
Fui reprovada. Certamente por descompostura.

Confesso que fui irritante de propósito. Fui bem criancinha prodígio explicadinha e articulada e sonsa. Mas ele pediu. Além do mais, se não sabe brincar, não desce pro play. Se você quer pagar de pimp, não aja como bitch.
Eu entendo a dinâmica tira-bom tira-mau tira-neutro, mas o tira mau tem que impor respeito, não dar soquinho de festim. A tira boa mandou bem em seu papel, a neutra também, mas o tira mau... tsk. Ele pode ter me reprovado, mas eu também o reprovei.

"Mas você não tentou de novo?"
O quê - e ter aquilo como professor? Ou morrer na praia com esse tipo de banca? Perdi a fé, foi mal.


* Sempre quis ser paga pra pensar, ao contrário da Luciana Gimenez e depois meio que consegui isso através da Bolsa Petrobras, mas isso é outra história.
** (desculpa, ele falou umas coisas que realmente não faziam sentido racional, então nem tive esteio pra guardar.)

Anotação à parte da monografia*

Salgado (2008) diz que o boca-a-boca é o maior divulgador de um livro para o leitor, e que ver gente falando em palestra, evento etc. é neutro (não influi na compra). Quem vê isso como positivo é a editora (grande) e o autor, claro.
A livraria compra o que sai na mídia (não importa quantas vezes) e o que as distribuidoras dizem que terá boa saída (Sá Earp e Kornis, 2005).
A Cauda Longa (Anderson) diz que tudo é questão de fazer o leitor encontrar seu livro e o livro encontrar seu leitor - haverá algum público para a obra.
Resultado: é preciso sair na mídia ou chamar a atenção do distribuidor (pras livrarias comprarem) e ter uma capa interessante (pra atrair o leitor), uma orelha interessante (para ele comprar o livro) e um conteúdo interessante (pra que ele LEIA e fale do livro com alguém, que o pedirá nas livrarias etc.).
Até as pessoas lerem, chuto que é de sete meses a um ano até um livro "acontecer", dependendo do porte e poder da editora.
Simples, não? Nem passa por editora grande ou pequena, muita ou pouca resenha, coisa assim. Ana Paula Maia está certa (mas eu tenho dados, heh).
É por isso que tem livro que povoa a mídia certa época, mas encalha: emperra na parte do boca-a-boca. Neguinho até compra, até lê, mas não recomenda (pelo contrário, elimina da estante, revende pra sebo; o que já vi e ouvi de livro autografado com amor que aparece nos sebos que frequento...).

*para uso pessoal.

27.8.09

kicking, screaming, gucci little piggy

Eu tenho um problema com obras de arte geradas por ressentimento. Por exemplo: O mundo é um moinho, do Cartola. Que música indigesta. Merece uma tijolada na testa.
Onde tantos veem dor sincera, eu vejo retórica - pra se consolar e convencer os outros de que foi injustiça. Tipo: sou corno mas você vai ficar velha, ãin!
Vai ficar mais claro assistindo a este vídeo instrutivo:

Né?

Na verdade, até gosto muito de algumas obras de arte geradas por ressentimento - como O Mestre e Margarita, de Bulgakov; ou coisas do Radiohead, embora a motivação nem sempre seja identificável... Karma Police ("arrest this girl, her hitler hairdo is making me feel ill") ou Paranoid Android ("when I am king, you will be fast against the wall"). Mas há ironia, há brincadeirinhas boas - a pessoa não se apegou ao próprio ressentimento. O que não dá é narrativa garota-da-laje. Aí minha reação é algo como MEU. DEUS. (arrepios de constrangimento e risadas altas).

P.S.: Nabokov é que é bom. Nabokov é rei. Mesmo quando seu personagem é um loser (Humbert, Lujin, Pnin), e quase sempre é, você nunca o sente como loser. E quando é vilão (Quilty), a mesma coisa. Nabokov demonstra um enorme carinho por eles.

No Zona Sul do Globo de hoje, com Thalita "Fala sério" Rebouças. Por sinal, não vou escrever um romance "sobre" a internet, mas "na" internet "sobre" videogames.

17.8.09

Dia 25, terça que vem, vai ter lançamento do Amostragem Complexa na livraria das Casas Casadas de Laranjeiras, Espaço Rio Carioca. A entrada é pela rua Leite Leal 45. Apareçam!

Auto-sabotagem

Meus pais sempre me botavam na Colônia de Férias do Exército, embora eu odiasse socializar, para se verem livres de mim durante as férias. Lá estava eu pelo terceiro ano, o último em que seria admitida, quando de repente nos meteram na mão uma carabina de chumbinho e mandaram acertar as bolas de encher num alvo uns metros à frente. Detalhe: éramos uma turma só de meninas. De dez anos de idade. (Exército israelense.)
Eu simpatizei um bocado com aquela atividade que me era familiar - pelo alvo, pois eu brincava muito com os dardos do meu falecido avô -, embora tivesse pena/medo de estourar bolas de ar, mesmo autorizada.
O fato é que ouvi as instruções do soldadinho - apóia arma aqui, coloca a mão acolá - enquanto lembrava do que fazia nos dardos e Monteiro Lobato ecoava em minha cabeça: toda arma dava "coice". O soldadinho não me contou isso, e certamente se espantou quando, imediatamente após a permissão para atirar, eu disparei três rápidos tiros que pegaram em duas das cinco bolas.
Entreolhamo-nos. Por um segundo inteiro. Eu e o soldadinho camuflado. Eu comecei a rir como, bem, uma menininha de 10 anos. E continuei a atirar.
Não acertei mais nenhuma bola, claro. Fiquei nervosa pela minha recém-adquirida importância; fiquei com medo de ser elogiada pelo "professor", me destacar demais como na escola e as outras meninas começarem a ser más comigo por despeito; possivelmente me passou pela cabeça alguma ficção escabrosa e eu não queria ser arrancada a meus pais pra virar sniper secreta do Exército Brasileiro. Seja como eu houver racionalizado o que me acometeu, isso explica muita coisa. Não mostrar-me-ei tão modesta quando os zumbis vierem, though.

16.8.09

comendo pelas beiradas

Não sou boa em arrebanhar seguidores - pessoas que se amarrem na minha personalidade e experiências. Acho mala ficar realçando tudo o que se fez, ou é capaz de fazer, de bom na vida. Respeito quem o faz de forma elegante, mas para mim a vida não é um processo seletivo... peraí, a vida é um processo seletivo, mas eu não quero trabalhar com qualquer empresa.
Sendo mais específica: não quero despertar o interesse de qualquer empresa. Então me camuflo.
Muitas vezes sou hermética demais; este blog é um tanto chato. Mas todos os movimentos são friamente calculados. Faz parte da minha personalidade, mas não nativamente; é como uma camada extra, um véu. As cores - as cores, as cores - estão por baixo disso tudo. Se eu gostar de você eu vou deixar você ver. Mas não vou mostrá-las para qualquer um.
Adoro acepção de pessoas.
A acepção de pessoas já me feriu muito até eu perceber que eu não queria mesmo estar perto das pessoas que me repeliam e que, pasme, elas estavam certas; aí comecei a adotá-la. Estou falando, é claro, do pré-escolar até, sei lá, sexta série, quando comecei a relaxar.
O que sei é que, com isso, tudo para mim demora mais. Aparecer, fazer amigos, avançar na carreira, achar determinadas agruras da vida aceitáveis. Por outro lado, acho que a qualidade de tudo o que acabo obtendo é muito superior à de quem investe em quantidade ou velocidade.

9.8.09

Jacinto Bonde, o espião que desafinava

Filme de que participei na oficina do Michel Gondry no CCBB:
Fui Bonde Girl e dei porrada numa menina, com efeitos sonoros. Ana Paula Maia, que me arrastou pro CCBB, estrela como a mãe da menina.
Muita gente boa estará lá. E eu também.

7.8.09

Jornalistas necessitam de bloquinhos - pelo menos eu achava isso. Os melhores bloquinhos eram os da União - pelo menos eu achava isso. E a imprensa impressa não deu a menor nota quando a União fechou de vez (os sebos da Praça Tiradentes, por outro lado, viraram um dramalhão mexicano).
Desde 2002, a União foi encolhendo, encolhendo, até que, um dia, sumiu. Foi substituída por um sushi bar (em cima), uma butique de café (embaixo) e, ao que parece, uma empresa de consultoria (no meio).
Talvez estejam certos. Não é relevante. Talvez eu seja a única pessoa viva que sente falta da União. Ainda tenho um bloquinho virgem dela aqui em casa (comprei dois no final de 2008, pressentindo perigo).
Confesso: sou nerd de papelaria. Herdei isso do meu pai, acho que não tem muito o que fazer a não ser ceder.

O problema das papelarias modernas, in a nutshell, é que elas fazem vitrine de dia dos pais. Estou falando da Papel Craft, da Papel Picado etc. Também costumam ficar infestadas de adolescentes miguxas abrindo e fechando agendas rosas purpurinadas. Eu mesma arrastei muita amiga pra elas, nos anos 90, com a isca dos estojos com borrachas coloridas cheirosas. Mas eu gostava (e gosto) mesmo é dos cadernos e canetas com design inteligente que você encontra nesse tipo de papelaria.
Agora, se você quer uma faca Olfa, uma fine point Staedtler ou uma linda borrachinha Faber Castell, não vai encontrar. Não nesses lugares. Pelo menos, não bem organizada e armazenada. Esses estabelecimentos costumam ser uma bagunça. Se especializaram em coisas fofinhas.
As coisas não-fofinhas podem ser encontradas numa Kalunga, por exemplo. Envelopes de todos os tamanhos são vendidos a cento e canetas à dúzia para os office-boys fazerem o feirão do escritório. Coisas pequenas como Olfas, Staedtlers e cartuchos de impressora estão trancadas num caixão de vidro e você tem que chamar alguém para abrir para você. Eles vão levar o que você escolher numa sacola de poliéster opaco para trás do caixa, de onde, depois de pagar, você poderá retirá-las.
Não sei vocês, mas isso me dá vontade de chorar. Especialmente quando descobri, hoje, por um porteiro antipático, que a União fechou pra virar sushibar. A butique de café seria até legal se não sofresse com o constante cheiro de peixe da entrada compartilhada com o sushibar (sério? sério).

Fui forte, apenas porque lembrei da Casa Cruz, que ainda mantém seu sortimento dúbio de coisas macias de menininha e coisas úteis de macho, e ainda parece bem de saúde financeira. Aliás, voltou com força triplicada depois do incêndio. Adquiri meus envelopes emocionada. Agora só vou comprar lá para que, pelo menos, ela não morra antes de mim.

Ainda tem Letraset lá - um sortimento reduzido, mas há.

28.7.09

Pequeno conto meu para a Superpedido deste mês: http://is.gd/1RwDd A restrição: tinha que se passar numa livraria. Agora, só falta me pagarem por ele. (P.S.: pagaram)

25.7.09

flashback

Minha entrevista aos 17 anos no Jô Soares em 2000 (a pedido):

parte 1
parte 2

22.7.09

Depois que li Cthulhu, fiquei lembrando de um trecho de A feia noite:

Deuses extintos, sólidos e onipresentes, orquestravam a violência, desorientando os caçadores uns contra os outros; revanche contra a insignificância luminosa dos engenhos atados ao topo de suas cabeças, e contra aqueles que não pegavam o verdadeiro espírito, abrindo a boca em êxtase para chamá-los, e a todos os seus domínios, maravilhas. De cima era perceptível: as praias eram frias e ameaçadores os malabares de espuma branca, e para não acreditar tanto nisso, todos lhes davam as costas, como no passado, até amanhecer. As vias podiam enrolar-se como uma esteira e tragar o que quer que estivesse por cima; florestas abriam-se nos lugares mais impróprios; os lugares mais ruidosos revelavam-se na verdade os mais silenciosos, e a resposta dos ignorantes era fazer dos lugares mais silenciosos os mais barulhentos. Mas os deuses se riem dessa mímica ingênua de civilização, o anúncio exultante de que agora todos os vulcões estão extintos, quando por baixo da crosta corre a lava preta.
Tenho recebido muito feedback do Amostragem complexa de gente do Sul e do Nordeste, mas nenhum do Rio. Às vezes tenho a impressão de que as pessoas daqui não leem mesmo e, se leem, não se empolgam. Não é só comigo não. Ando nos mais diferentes meios - jovens, ricos, pobres, velhos, sarados, sedentários - e, exceto pelo pessoal de literatura, a única conversa literária que ouço aqui é assim:
- Puxa, adoro Clarice Lispector.
- Ah, Clarice!
E é óbvio que você não leu mais de uma crônica por email dela em toda a sua vida - e, se bobear, nem era dela, e sim um Mude tosco da vida.
Vejo minha mãe comprar livros do João Ubaldo Ribeiro que empilha em sua cabeceira e não lê. Ela chegou a me dizer, sobre a Flip, que é muito mais legal encontrar um autor do que ler o livro dele. O marido dela lê muito, pelo menos, mas geralmente só livros de história e negócios.
Eu sinto falta, no Rio, é de gente se empolgando com algum livro. Não importa qual. Às vezes parece que só eu me empolgo aqui. Falo de livros e os empresto pra todo mundo, de acordo com a personalidade do interlocutor, é claro. E geralmente as pessoas se interessam, e depois chegam a me agradecer por ter apresentado o tal livro pra elas. Minha irmã postiça (ela é de Curitiba) e meu amigo Ismar (ele é escritor) estão nessa categoria, mas fico orgulhosa mesmo é pela minha avó, carioca da gema, ter gostado tanto de Clube da Felicidade e da Sorte.

21.7.09

como não fazer um romance pop

Acabo de me dar conta de que atualmente estou escrevendo uma monografia para a faculdade, uma história em quadrinhos bastante escrachada e dois romances: um sério com uma pitada de scifi e outro de estrutura mirabolante com tema nerd-pop (tirei essa definição da orelha agora). Para mim, mais do que apenas fácil, trafegar entre as linguagens e os níveis culturais de cada projeto chega a fazer bem. Oxigena minha cabeça. Passei cinco anos obcecada com os personagens de A feia noite, meu segundo romance, simplesmente porque tinha decidido me concentrar "só naquilo" e deixar os outros projetos para depois. Big mistake. Enquanto outras pessoas precisam se concentrar em um projeto para fazê-lo render, eu preciso mesmo é diversificar - para arejar.

Enquanto escrevo e planejo o meu romance de estrutura mirabolante com tema nerd-pop, me veio à mente quantos erros já vi autores cometerem ao querer colocar uma pitada pop em seu romance. Me vieram à mente coisas que não se deve fazer de jeito nenhum:

- batizar personagens com o nome de seu personagem obscuro de HQ favorito;
- citar a(s) banda(s) indie(s) mais foda de todos os tempos da última semana, especialmente para caracterizar algum personagem (isso não funciona nem dentro da semana - de fato, isso não funciona com banda nenhuma, e diria até que com escritor nenhum);
- salpicar referências a esmo quando precisa fazer uma sequência de sonho ou fluxo de consciência;
- fazer de algum personagem um especialista (a não ser um especialista soft, ou para ridicularizá-lo, ou então para jogá-lo num tanque de jacarés - recompensar o leitor, excelente técnica narrativa).

E a regra que engloba todas as anteriores: não tente demonstrar como é profundo conhecedor de todas as formas de cultura, na faixa "olha como sei ser tosco & sofisticado!" (faça como eu, deixe isso no blog). Poucos compartilharão do seu precioso repertório, e isso não lhe trará a glória, tampouco inimigos invejosos, mas meros bocejos. Além de ser chato, ainda costuma mascarar uma profunda falta de vontade/ capacidade em contar alguma história que preste. Pronto, falei.

Apesar de No shopping ser chamado de romance pop, fui comedida na citação de bandas. Citei Massive Attack e Britney Spears, pelo que me lembro, e mesmo assim sem muita fanfarra.
Acho que este meu novo romance exibirá um certo parentesco com No shopping na medida em que o pop foi incorporado a sua estrutura, e não implantado no texto feito silicone.

18.7.09

Segundo dia de estágio.
- Colocamos a sigla do tradutor nesta parte do rodapé. Precisamos de uma sigla para você. Mas seu nome tem as mesmas iniciais da SC, então... qual é seu nome do meio?
- Silva.
- Você pode ficar sendo SS.
- Como a polícia secreta nazista? - e cerrei os olhos significativamente e sorri.
A gerente de projetos continuou me olhando.
- SS era a sigla da polícia pessoal do Hitler na Segunda Guerra Mundial.
A gerente de projetos continuou me olhando. E eu pensei cá comigo, epa, juntar as coisas ir pra casa. Mas ela finalmente falou, depressa, contrita:
- Por quê, você não gostou dessa sigla? Quer outra? Podemos inventar outra. Qual você quer?
Às vezes tento ser engraçada e soo perturbadora; e vice-versa. Talvez eu seja inexpressiva, ou talvez sutil demais para o Rio de Janeiro.
Vocês devem ter percebido que fiz a piada porque queria que a gerente de projetos fosse inteligente, e tivesse tino cômico, e risse. A piada era um teste em que ela foi reprovada com louvor (e, puxa, eu também: zero em malícia, ou dez em inocência). Apesar de incidentes desse tipo, nunca deixei de testar as pessoas e seus limites. Não quero uma vida chocha.
A lição é que pessoas como eu sempre vão se decepcionar com o mundo do trabalho, porque as pessoas que mandam em você costumam ser, com raríssimas exceções, portas - das bem maciças. Mesmo que você já saia de casa esperando o pior do trabalho, as melhores capacidades de imaginar este pior não chegam nem perto da forma sofisticada como é pior na realidade.

10.7.09

wait a minute mr. postman

Carta de uma mulher da cidade de Naor ao rei de Ur, datada mais ou menos de 2000 a.C., inscrita numa tabuleta de argila em caracteres cuneiformes e encontrada em meio às Cartas de Mari:

"Dizei ao meu senhor, Thus Inib-Sharim, tua dama e serva. Quanto tempo devo permanecer ainda em Naor? A paz está selada e a estrada, desbloqueada. Permita que meu senhor me escreva e permita-me ser levada para ver o rosto de meu senhor, de quem estou separada. Permita que meu senhor, além disso, escreva-me uma tabuleta em resposta." (grifo meu)

Viu? É histórico. Os homens nunca mandam tabuletas no dia seguinte.

8.7.09

Jacko Jesus

Acabei de reler meu scifi Penados y Rebeldes (que escrevi como Filipa Borg). Ainda acho muito bom. Uma palhinha:

"Alguns segundos depois de engatar-se na rede do visualizador VeriSim, o desprogramador do Juruá-Purus se viu no sopé de uma colina. Lentamente, com a alegria dos santos, seus clientes tweens caminhavam em direção ao topo. No topo, estava um ser magro, alto, com um longo capote e dezenas de dedos na ponta do braço, finos como raízes. Ao seu lado estava uma mulher pálida e magra de uns 30 anos.
Kaapor ligou a etiquetação. Sobre o cara de capote, apareceu a etiqueta “Jack Jesus”. Sobre a moça a seu lado, “M&M Geller”. Nisso, Kaapor ouve atrás de si:
- Pedófilo desgraçado! O que quer com nossos filhos?
Um pai engravatado, vermelho de raiva, surgia dos limites da pradaria sob a colina, liderando uma multidão de pais injuriados que corria tão bem quanto podia, ou seja, em câmera lenta.
A resposta de Jack Jesus foi sacudir as longas madeixas e dizer com uma voz que preenchia todos os espaços:
- Nunca ouviu falar em "vinde a mim as criancinhas", mente suja?"

7.7.09

Querido Diário

Rio, 19 de novembro de 1994.
Usei o modem para conversar com o computador do dindo. Legal! Ele escreve lá, sai aqui. Eu escrevo aqui, sai lá. Até me passou um arquivo!
Legal mesmo!
Simone


Lembro que foi muito complicado - tive que pedir para a minha avó e a empregada ficarem longe do telefone, e depois gritei para elas virem ver porque algo impensável havia acontecido - uma imagem tinha se materializado no meu computador, mais exatamente esta:

Era esse tipo de incidente que eu registrava no meu diário cor-de-rosa. Trocar arquivos pela internet com o padrinho. Ganhar concursos. Criticar os canais da recém-instalada NET. Reclamar que meus amigos só vinham à minha casa pra jogar videogame.
Eu nunca falava de livros, mas é visível o quanto eles influenciavam a minha linguagem no diário. Quando comecei meu primeiro diário sério, aos seis anos, eu imitava a tradução portuguesa do Diário de Anne Frank, usando um vocabulário muitíssimo mal-colocado (eu não "brigava", eu "pelejava", entende?).
Mas eu queria mesmo é ter achado meu "diário" no caderno dos Transformers que eu ganhei de brinde no aniversário de quatro anos do Igor, mantido dos meus 3 a 5 anos de idade. Tudo o que ele continha eram desenhos e rabiscos incompreensíveis, porque eu não sabia escrever, embora já bolasse frases e ficasse angustiada por não saber registrá-las, rabiscando, por isso, as linhas do caderno dos Transformers. Mas depois eu ficava frustradíssima porque não conseguia ler o que tinha "escrito".
Eu gostava muito do caderno dos Transformers porque, pra mim, aqueles robôs gigantes estavam protegendo meus segredos. Bem melhor que os ursinhos que me deram depois para o mesmo fim.

6.7.09

Chespirito

Agora que li Hamlet é que entendi porque Roberto Bolaños, criador do Chaves, era conhecido como Chespirito ("Shakespearito").
- Alguém se lembra do episódio em que Dona Neves se faz de louca porque "os loucos não têm responsabilidade por seus atos" e, portanto, não precisam pagar aluguel? Pois então: Hamlet.
- E o episódio dos baldes d'água, onde se diz que "a loucura se cura com um choque forte"? Também há uma fala assim em Hamlet.
- Aparições de fantasma em Chapolim, mais assustadoras porque descritas vividamente por outro personagem
- Episódio de Seu Madruga achando que vai morrer
- Sr. Furtado e sua culpa oculta
- Professor Girafales e Chiquinha = Polonius e Hamlet
- Professor Girafales e Quico = Claudius e Hamlet
- Tenho certeza de que vi essa história do rei acabar virando cocô de mendigo em algum episódio

Imagino um exímio contador de histórias se dando conta de que está no México, e não na Inglaterra elisabetana, e percebendo que tem que fazer um seriado mambembe e humorístico, e não peças imortais. Do mesmo modo, uns se especializam em Shakespeare, outros em Chespirito. E você, percebe?

27.6.09

Are you OK, Annie?


A melhor cena de Annie, na minha opinião (começa aos 6:40 do vídeo acima), é quando ela sai da cama para entrar no escritório do ricaço Daddy Warbucks em busca de atenção e, enquanto isso, atrás dela, um sujeito barbudo de terno saltita pelo jardim da casa. Mas Warbucks a ignora e continua trabalhando enquanto o sujeito barbudo arremessa uma bomba dentro do escritório, estilhaçando uma janela. Enquanto Annie olha atônita e Daddy Warbucks continua vituperando em sua ligação intercontinental, o criado oriental de Warbucks (Asp) passa a bomba para o criado indiano, que a arremessa de volta para fora com uma elegante pirueta, onde ela explode. O cão de Annie arrasta o sujeito pelo terno, Asp lhe dá alguns golpes de caratê e o indiano o imobiliza, levando-o para dentro.
Aí Annie diz à secretária, chocada:
"Who would try to kill Mr. Warbucks??"
"The Bolsheviks, my dear. He's living proof that the American system works and they don't want anybody to know that."
"The Bolsheviks? Leapin' lizards!"

Ninguém, no entanto, pergunta se Annie está bem. O que funciona a favor da cena.
(Annie é de 81, Smooth Criminal de 85.)

25.6.09

there's no spark

Eu gosto de Lígia especialmente pelo começo. O refrão já fica excessivamente meloso - suspeito que por intromissão de, puah, Chico Buarque. Mas o princípio denota um diálogo de sucessivos tocos dados por Lígia em um pretendente.

- Eu sonho com você todo dia.
Eu nunca sonhei com você.
- Gosta de cinema?
Nunca fui ao cinema.
- Vamos pro samba, então. Ou à praia. Vamos, Lígia?
Não gosto de samba, não vou a Ipanema.
- Então vamos para o Horto. Num dia de chuva ou de sol, você é quem sabe.
Não gosto de chuva, nem gosto de sol.

*de Lígia (Tom Jobim e Chico Buarque)

23.6.09

post do triunfalismo nerd

Trabalho em grupo, até o Ensino Médio, significava correr atrás das outras pessoas para fazer a parte delas antes que elas fizessem besteira. Mas com a internet - que me atingiu em sua plenitude lá pelo 2o ano do Ensino Médio - e a faculdade de Produção Editorial comecei a encontrar colaboradores dignos, com ideias ótimas, que complementam as minhas (e vice-versa). Em Produção Editorial, a confiança atingiu níveis tais que cheguei a fazer trabalhos em dupla no esquema "você faz um, eu faço o outro, e no dia da apresentação a gente se encontra antes da aula e se inteira do que a outra preparou". Quando a competência dá as mãos, o mundo é sua caixa de areia - e os incompetentes ainda não perceberam, claro, mas ficará cada vez mais difícil para eles subirem na carreira. Até porque suas velhas armas - puxar o saco, roubar ideias alheias e sabotar quem é melhor - e seus vícios de destrabalho - nivelar por baixo, desistir quando parece difícil - não valem nada num mundo que cobra cada vez mais resultados concretos.
Tenho visto de escritórios de arquitetura a agências de propaganda, e dos grandes, sendo trocados por outros porque não mostraram serviço. Há que mostrar serviço, e serviço consistente.
E tenho dito.

17.6.09

Ôlho

Ontem dei uma portada na minha vizinha. Foi sem querer. Ela veio jogar um lixo fora bem no momento em que eu empurrava a porta do elevador, e não manteve a distância defensiva, por assim dizer. Além disso, a porta é ultrapesada, precisa ser empurrada com força, e tem um minúsculo retângulo para você ver quem vem chegando.
Pedi desculpas, mas não acho que ela tenha aceito. Até porque temos uma história - reclamei de algumas coisas que ela fazia, e ela parou, mas não parece em paz com isso (também).
O que fiquei pensando, na verdade, enquanto eu enfiava a chave na fechadura e ela também, é que ela olhou para dentro da minha casa, provavelmente vendo a decoração meio retrô, o gato, a quantidade excessiva de livros e a Bíblia aberta em frente ao computador ligado. O que ela deve ter pensado? Certamente, não que sou crente, pelas roupas e horários em que saio.
Serial killer foi minha aposta. Figurinha mais crível que escritora.
Agora que ando jogando jogos de fuga, acordar de certos sonhos ficou bem mais difícil.
Sonhei que estava numa casa desconhecida, onde acessei um vídeo na internet e depois adormeci no quarto ao lado.
O vídeo era um curta japonês maluco, de época, sobre uma filha de nobres decadentes que não queria se casar com o consorte, e foi, claro, uma seção separada do sonho. Lembro que, pelo computador do sonho, mandei o link desse curta-sonho para duas ou três pessoas (é óbvio que agora tenho que checar se elas receberam).
Mas depois que eu adormecia dentro do sonho, no quarto ao lado, eu sonhava que estava numa praia onde pessoas do meu passado que não tinham nada a ver comigo jogavam voleibol. Era um sonho com outro clima, completamente diferente, de amplitude e frescor. Inclusive, quando a brisa marítima me atingiu no rosto, senti um desejo incontornável de entrar na água de roupa - e foi o que eu fiz. Bastou eu entrar, porém, para acontecer o que sempre acontece quando estou na praia em sonhos: o mar começar a engolir a praia e, depois, até a terra. Mas já aprendi a flutuar nessas condições, então simplesmente aproveitei. Quando o mar voltou à calmaria (desistindo, talvez, de me afogar), eu percebi que o sonho tinha acabado e que era hora de sair dali. Me deitei na pele da água e fechei os olhos. Quando abri de novo, estava de volta à cama. Mas não à minha cama. Eu estava de volta ao sonho anterior, tal e qual.
- Funcionou - observei - mas ai. Ainda falta acordar no quarto certo.
Minha mãe interviu, dobrando umas fronhas:
- Essa não é sua casa. Procure a saída.
Então o sonho assumiu uma interface meio Myst. Depois de procurar pelo quarto, desisti e abri a porta. Havia um banheiro em frente e, ao lado, o quarto do computador, com a porta entreaberta. Foi o que eu escolhi.
Nesse quarto, o que logo me chamou a atenção foi o espelho. Como sempre nos meus sonhos, olhar no espelho mais que três segundos exibia uma imagem ligeiramente distorcida, pendendo para o monstruoso. Mas ainda assim, me pareceu uma possível saída.
Como cada sonho tem regras diferentes, decidi testar minhas suspeitas: avancei a mão e toquei no espelho. Sim, ele era uma membrana permeável, e dava para o lado real. Minha mão tinha acordado quando ultrapassei o espelho com ela. Então tomei distância, a maior possível no pequeno quarto, e pulei contra o espelho. Fiquei entalada na metade, então resolvi fechar os olhos e esperar. Só aí eu acordei no meu verdadeiro quarto.

14.6.09

it's ALIVE

Achei o primeiro blog que tive na vida, em 2001: http://desembucha.brinkster.net/exibir-blog.asp?blog=simonecampos
Eu era muito empolgada.
Tem o esboço de A feia noite (sim, já em 2001).
E o servidor que o abrigava subiu no telhado pouco depois do 11 de setembro. Achei que nunca mais veria os meus posts.
Depois vou incorporar os posts dele a este blog, nas devidas datas.
E, nossa, quero ver dizerem que "surgi dos blogs" agora.

11.6.09

efeito folhetim

Eu tinha esquecido do frisson que é ter que esperar a foto ficar pronta, em vez de ver como ela ficou na mesma hora. A máquina digital nos roubou isso.



Mais resultados, no Flickr.

8.6.09

6.6.09

Não sei o que é maior: minha ojeriza por gente "do bem"/"gentileza gera gentileza" (T-shirts available) ou minha ojeriza por gente que implica por recalque.
descompressão

Sei que devia compartimentalizar mais a minha vida - tipo, não misturar assuntos pessoais e profissionais no blog; não postar pares de coisas díspares, como pole dancing X ponto cruz, ou pró-choque de ordem X clubbing, ou nerdice X fashionismo - mas não tenho muita paciência para manter abertos vários estabelecimentos virtuais diferentes. Resultado é que a maior parte das pessoas gosta muito de uma das pontas da minha vida mas não tolera o todo.
Às vezes penso que sou um personagem inverossímil. Ou que estou fazendo o que tanto desdenho, usar "metamorfose ambulante" como desculpa para falta de coerência. Mas sou coerente com minha complexidade: gosto de manter minhas opções abertas. Realmente gosto de robôs gigantes, ponto cruz, vintage, fofice (kawaii), tradução, literatura, cinema, anime, gatos, videogames, quadrinhos, divulgação científica, dança do ventre, coisas toscas, animação, sexo, música eletrônica, livros (com fetiche), ópera, fotografia, política, ficção-científica, design e não designers, Tijuca e não Ipanema, países insulares e tantas outras coisas. Que fazer?
(Decidi usar negrito, mas não vou abusar.)
Lista de gente que fez bem ao Brasil e o Brasil tratou mal

- Monteiro Lobato
- Mauá
- D. Pedro II
- Fernando Sabino
- Wilson Simonal

Tem umas pessoas que eu particularmente questiono se fizeram bem mesmo, então não entraram na lista. Ou então, eu posso simplesmente ter esquecido. Mais algum? Mande-me um e-mail.
Top 10 países preferidos

1-Escócia (e Inglaterra, e o resto do Reino Unido)
2-Japão
3-Rússia
4-Polônia (e Ucrânia, e o resto das ex-repúblicas soviéticas)
5-Brasil
6-Portugal
7-Chile
8-Espanha
9-Canadá
10-França

- Se não fosse o meu gosto moderado por tosquice, essa lista poderia ser muito diferente.
- Na lista tem países que eu não conheço, e nem todos os que conheço entraram na lista.

2.6.09

"Teeth" é legal, mas não tenho coragem de recomendar aquilo pra ninguém. Veja por sua conta e risco.

30.5.09

Cena dos anos 90

– Vamos cedo, disse Monica. Quero ficar lá no “gargarejo”.
Era o meu primeiro show sozinha, de adulta, com as amigas. Já tinha acompanhado meu pai recém-divorciado ao show do Tears for Fears, mas aquilo era diferente. A roupa foi diferente também: vesti uma blusa de botões prateada que eu e minha mãe compartilhávamos e botei maquiagem.
Fomos mesmo para o que a Monica chamava de gargarejo, um pouco à esquerda. Começaram a tocar e, mal começaram, os meninos vestidos de preto começaram a moshar. Mas não era bem mosh, estava mais para
– Porrada! Porrada! – açulava Monica.
O show prosseguiu, tocando todos os sucessos do cantor, consagrados na década de 80 e repopularizados devido a um recente disco de remixes. No palco, a posição mais avançada era a do saxofonista louro, que lançava longos olhares para as menininhas e usava uma calça de couro apertada que exibiu, durante algum tempo, o que a mais avançada do grupo logo identificou como uma ereção. De vez em quando ele olhava para o nosso lado, mas eu achei aquilo vagamente nojento e me ocupei mais em dançar.
De repente, em vez de emendar em outra, a música parou. Estavam recalibrando para algo complicado. Demorou tanto tempo que Monica sentenciou:
– Ihh... deu tilt!
E virou pra trás e começou a bater papo, dizendo como o saxofonista era lindo, mais lindo que o cantor, e inventando formas de chamar a atenção dele.
De repente, o palco começou a tremer com um ruído de baixa frequência. Era o baixo de uma versão eletrônica de “Ando meio desligado”.
O público esfriou completamente. Era mesmo uma versão muito chata. No meio do solo, um maluco começou a gritar:
– Pára com essa merda eletrônicaaaa! Caralhoooo! Filha da putaaa! Música de viadoooo! Eu quero é roquenrooool!
Era uma versão muito chata mesmo, mas aquele cara era mais. Ficou gritando aquilo até a música terminar, e eu senti vontade de dizer a ele que eletrônica não era nada daquilo – eu que já estava começando a gostar. Mas calei a minha boca.
Um ano depois, descobri como baixar MP3s na casa do meu pai e danou-se.

27.5.09

Quando a Maísa arrancou a peruca do Silvio ninguém chamou a Secretaria da Terceira Idade.
E tem mais, aposto que ele chorou também - no camarim.

26.5.09

proibido para menores

Estive remexendo no A feia noite para um projeto e me bateu que muita gente, inclusive escritores, não tem noção do trabalho que dá fazer um livro - especialmente um livro como aquele.
Eu pesquisei As mil e uma noites, São Francisco e Santa Clara, o sincretismo de ambos, marketing político, problemas psicológicos, efeitos de diferentes antidepressivos, distúrbios de sono, superdotação, teoria do caos, vários conceitos matemáticos, e dezenas de livros e filmes com "noite" no título.
Veja, por exemplo, a cena de A feia noite em que o marqueteiro político Francisco revista a bolsa da Maria Luiza enquanto ela toma banho:

"Olhos na TV, interessadíssimos na fala pastoral, a mão-boba tem vontade própria, se estende e puxa qualquer coisa lá de dentro. Algo de couro, por exemplo. Um chaveiro que também guarda moedas. Mergulha de novo: uma lamy. Óculos escuros. Tateia mais profundamente desta vez, esquecendo-se da farsa e olhando para ver direito o que estava fazendo: enfiando um antebraço inteiro num local proibido, it goes deep."

Daí se infere que pesquisei até pornografia. Pode rir, vai. "Pesquisar pornografia" soa tão mal que nem vou tentar me defender. Mas me rendeu inúmeras metáforas, verbos e ideias novas. Sem falar em noções de beleza, perversão, degradação, dominação etc. etc.



Isso aparece muito nas atitudes fatais de Maria Luiza, mas nos pequenos detalhes também. Certas roupas, verbos como "trespassar", o uso de facas de caça e silvertape, as referências a necrofilia... agora não está tudo na ponta da língua (por sinal, local onde Maria Luiza possui um discreto piercing). Curiosamente, não considero que o pedófilo do livro tenha saído dessa pesquisa específica, e sim das necessidades da narrativa.
Eu nunca disse que A feia noite devia ser lido por crianças. Ao contrário, aliás, de No shopping, que só pode ser lido por menores de idade. Quem não estiver preso nas engrenagens pré-vestibular e pré-escolha de companhias não vai saboreá-lo, a não ser que tenha ótima memória ou seja muito imaturo.
Acho que já encontrei um tom que sirva tanto para o leitor iniciante como para o experiente no Amostragem complexa (contos). Mas ainda estou devendo um romance nesses termos.

P.S.: mais desenhos de Maria Luiza aqui.

25.5.09

Olhando a capa do caderno literário

Cansei de gente que escreveu livro importante. Quero ver gente que escreveu livro bom.

21.5.09

esse modelito da estação passada

Calma, citei Legião Urbana mas não é sinal de demência! Aliás, foi depois de ouvir Flores do mal no rádio que relaxei e admiti que não suportava Legião Urbana mesmo: era ruim. Antes eu ainda tentava contemporizar, ouvir aqueles disquinhos pseudo-românticos nas festas das minhas amigas (e as rodas de violão!) sem reclamar, mas... depois de ouvir esse verso, exatamente esse, do modelito da estação passada, sendo cantado com toda a pompa e gravidade renatorussianas, OK, joguei a toalha...

Mas divago. Eu ia falar era das batinhas. Essas batinhas de grávida que vêm vendendo desde 2002 como "blusa-padrão".
Muitas vezes fico achando que encontrei a blusa perfeita, mas assim que a tiro do cabide percebo que o corte perfeito dos ombros vai abrindo, abrindo, até chegar ao quadril duas vezes maior que o mesmo. Perfeito - como sacão de batata. Vestir saco pra mim é luto ou gravidez.
Antes das batinhas, vendiam-se as baby-looks, lembra? Blusas curtas demais, que mal cobriam o umbigo (se é que chegavam até ele), divulgando o baconzinho de tantas dietas à base de biscoito. E eu usei? Sim, até os 19 anos. Depois, comecei a achar ridículo.
Isso tudo é opinião pessoal, mas reparei numa coisa: quando a moda muda, eu não a sigo. Primeiro, eu a questiono.
Tenho meu estilo; se as coisas que eu gosto vão ficando muito difíceis de ser encontradas, porque a moda do momento não casa com elas, eu me recuso a comprar o que a moda oferece só para acompanhá-la.
Meu gosto não permanece exatamente o mesmo, claro - ele muda gradualmente, assim como o meu corpo, minha idade, minhas experiências - mas certamente não muda a cada estação, como a indústria da moda gostaria.

Não vou jogar minhas blusas berinjela fora porque alguém decidiu que isso está out. Eu fico bem de berinjela. Eu, hein.
Também não vou ficar putinha se o berinjela entrar na moda e todos começarem a dizer que usavam berinjela desde criancinhas. Vou é estocar boa berinjela. Eu sei que aquela batinha berinjela não vai ficar bem em mim e a jaqueta sim, enquanto que a pessoa desesperada vai comprar qualquer coisa berinjela, mesmo que a cor não a favoreça, mesmo que a peça seja medonha, só porque o berinjela está na moda e ela precisa usar berinjela.

(Prometo não usar a palavra "berinjela" de novo até o fim desse post.)

O mesmo vale para as ideias. Os movimentos literários vêm e vão, o que você faz sai e volta à moda, mas você - em "essência" - continua quase igual. O que te interessa e o que você produz a partir disso não muda tão radical nem tão rapidamente quanto a lista de mais vendidos exigiria.
E não há nada de errado com isso. Deixe a moda se afastar, relaxe, use o que você gosta. Um dia ela volta. Ou não. Mas aí você será o único usando... para o bem e para o mal.

18.5.09

as sete pragas do Egito

Na minha cozinha têm entrado umas mariposas pretas que, ao que parece, perdem as asas e viram umas lagartinhas nojentas. Elas se prendem ao teto e ficam por lá deslizando. Elas parecem não gostar de nenhum outro lugar, nem o da sala; apenas o laranja-COMLURB de que pintei o teto da cozinha as atrai. De vez em quando eu ponho a escada e estalo algumas com o chinelo: parecem espinhas gordas.

Uma coisa esse apartamento não tem: baratas. De resto, vive sendo invadido por bichos estranhos, às vezes hordas deles. Há épocas para cada praga. Hordas de abelhas, de cupins, formigões, do mosquitinho que deixa cheiro de mato depois de morto, do verdinho que gosta de pousar na tela do computador... e eu nem mantenho uma lavoura (não compro, nem planto...)

Mas os piores são os unitários. Quando o bicho entra sozinho, é porque é punk. É um bicho que eu mesma não vou conseguir tirar e vou ter que chamar o porteiro ou jogar um gato em cima. O morcego, por exemplo. Ou a libélula gigante que a saudosa gatinha Pirata encurralou e, quando ferida, começou a soltar uma espécie de "linha" peguenta verde-água. Como a Pirata fazia questão de comer tudo o que caçava por puro orgulho felino, tirei o bicho dela e joguei fora.

Mas o hors-concours foi um besouro de olhos fosforescentes que invadiu a minha sala certa madrugada, no meio de uma partida de Chrono Trigger. Demoníaco, radioativo e transgênico, o bicho me impressionou tanto que o prendi num copo e fiz um vídeo dele.

Se alguém conhecer essa espécie, gostaria de saber qual é.

17.5.09

Após detonar autores autobiográficos, fiz um videozinho pra explicar a egotrip do meu novo conto, O aleph de Botafogo. Quando você vai poder ler? Acompanhe aqui. É pulp, gente, é pulp...

11.5.09

AFAN

Se o escritor é narcisista, você só vai gostar do que ele escreve se concordar com ele: que ele é o máximo. O problema da literatura autobiográfica é que, se você não topa o autor, logo não topará a literatura dele, baseada na vida dele, com personagens que bailam ao redor da versão idealizada dele.
Se às vezes isso facilita extremamente a vida do crítico, por outras complica demais: como separar não-gosto-de-você do não-gosto-da-sua-obra se a sua obra, admita você ou não nas entrevistas, é você?
É preciso um certo desapego do que se acha, se dar espaço para gostar do livro, como num teste cego. Eu adoro um livro da Fernanda Young, o A sombra das vossas asas, embora ache ela e os demais livros extremamente chatos. Mas, das recentes, ela é das que mais usam a imaginação.
Ninguém disse que o escritor tem qualquer obrigação de facilitar trabalho de crítico - ou de qualquer leitor. Mas o autor de ficção autobiográfica narcisista (AFAN) deve estar preparado para severos golpes no ego ao colocar sua vida no papel. Quer dizer, ele não tem o direito de reclamar. Se chamarem de inverossímil, não vale dizer “mas aconteceu! Eu juro! Quer ver o vídeo?”, e nem dizer "ah, mas essa parte aí é ficção". Se o chamarem de chato narcisista, não vale apelar para Fellini, Zuckerman, sua mãe ou a divindade da sua preferência.
Mas acho que a maior parte dos AFANs só se preocupa em encontrar uma boa desculpa estética - um truque - para dar vazão ao seu imenso complexo de bukkake (só pode ser, porque punheta, antigamente, se batia a sós, e não direcionada para o rosto de outrem): o complexo de Deus de todo autor, a morte da literatura, Woody Allen, a geração fotolog...
O pior é que, se os AFANs pegassem esses temas e tentassem desenvolver em outra direção que não o próprio umbigo, talvez alcançassem alguma coisa. Mas não: todos querem ser príncipes...

8.5.09

Estava pensando: se eu fosse professora, como impediria meus alunos de usar CTRL-C + CTRL-V num trabalho?
Ainda peguei a época dos livros. Eu ia compilando dois, três livros diferentes, cada um com informações diferentes do outro, e ficava um trabalho enooorme. Mas na universidade, o problema dessa "esperteza" (vergonhosa especialmente depois da 6a série) já começou a afetar relações professor-aluno. Os trabalhos eram enormes e nem um pouco originais.
Tem professor burro que proíbe uso da internet na pesquisa, ou pede, "na boa", para usar "pouco" a internet.
Outros passam extensas provas em folhas de papel almaço para nos obrigar a ficar com a munheca doendo.
Eu já faria diferente: pediria um resumo.
O mal da internet é justamente o excesso de informação. Tanta informação que não se lê boa parte dela. É cortar, colar, ignorar. Trabalhos de vinte páginas sem um conteúdo original.
Mas com um resumo ou fichamento de uma ou duas páginas, as criaturas teriam que ler e trabalhar. Capaz até de terem de abrir um livro. Claro, provavelmente alguém inventaria um jeito de dar a volta nisso, mas seria mais trabalhoso do que fazer o trabalho, e a Lei de Gérson não perdoa ninguém, nem os trapaceiros.

30.4.09

tudo bem

Às vezes, na minha adolescência, eu dançava com tal abandono que os outros viam me perguntar se estava tudo bem – “tudo bem” como em “não está prestes a ter overdose?”. Não, não eram drogas. Tudo o que eu fazia era não ter noção e freqüentar uma certa igreja evangélica conhecida por pedir a seus frequentadores para louvar ou expulsar demônios um tanto ruidosamente – Deus ficaria satisfeito. Eu aprendi o abandono, aprendi a me entregar e a sentir o que estava sentindo. E aplicava na boate.
Eu me sentia desesperada, dentre outros motivos, porque ninguém jamais compartilharia desta experiência; ser clubber evangélica era pessoal e intransferível. E esse desespero me fazia dançar mais energeticamente ainda. E aí vinham me perguntar se estava tudo bem, para eu dançar daquele jeito. O que me fazia sentir mais sozinha ainda. Pelo menos na igreja ninguém vinha perguntar se estava tudo bem – se você estava lá, era dado que não estava nada bem, ou, pelo menos, que estava num momento fervoroso.
O pouco que tenho a dizer, do alto da minha experiência, é que tudo passa. E, se você cuidar para reter as coisas boas, elas têm maior chance de ficar por perto.

27.4.09

Cuidado com Mary Sue

Adaptado da Wikipedia em inglês e em espanhol, o artigo abaixo fala sobre falhas graves no uso do recurso alter ego, algo que vivo apontando. Depois coloco na Wikipédia em português, pode ter alguma serventia...

"Uma Mary Sue (às vezes simplesmente Sue), em crítica literária e particularmente em fan-fiction, é um personagem de ficção com maneirismos idealizados e batidos demais, com quase nenhuma falha aparente e servindo, em primeiro lugar, como realização da fantasia de seus autores ou leitores.

* O autor costuma ser do mesmo sexo que Mary Sue.
* O personagem favorito da autora, de sexo oposto a Mary Sue, vai se apaixonar e provavelmente terminará ao lado dela.
* Mary Sue costuma ter um poder extraordinário em sagas com personagens "mortais" em que abundam poderes psíquicos.
* Na maioria das vezes, as Mary Sue têm um passado trágico, que pode ser similar ao de algum protagonista.
* Com freqüencia, Mary Sue termina aparentada com algum personagem da história original.
* Se se trata de uma estudante, vem de alguma escola estrangeira e chega por um programa de intercâmbio.
* Se o personagem favorito da autora da Mary Sue já se encontra romanticamente envolvido com uma personagem existente na série original, ele preferirá Mary Sue sobre todas as coisas
* A Mary Sue provavelmente unirá romanticamente dois personagens, que no entender do(a) autor(a) deveriam estar juntos.
* Geralmente, a trama da história (fan-fiction) costuma estar centrada na Mary Sue.
* É querida pela maioria dos personagens e raramente tem defeitos (e se os tem, são mínimos).

Algumas variações:

Sue angustiada - Sue com passado trevoso, pelo qual sente medo e culpa. Mas nada que aconteceu com ela foi sua culpa.
Anti-Sue - o autor se esforça tanto para não fazer uma Mary Sue que constrói um personagem cheio de defeitos, extremamente desagradável.
Sue canônica- um personagem da obra original se comporta da forma como o autor bem entende, desrespeitando suas características estabelecidas na obra original.
Sue paródica - Sue feita pelo autor como paródia.
Sue vilanesca - ela se envolve com um vilão e começa a fazer maldades a seu lado, vencendo todos os heróis."

17.4.09

comparações espúrias

- Claudine está para Luce assim como Haruhi está para Asahina.

- Eclesiastes e Jó estão para a Bíblia assim como o trip-hop está para a eletrônica.
dislexia galopante

Eu tentando digitar CRITIQUE: criqituqe
Abri um twitter só pros trocadilhos da barra de título desse blog. Estou seguindo uns amigos e, mais avidamente, certos personagens fictícios. Orwell me livre de alguém seguir a minha pessoa, nem que seja virtualmente, de alguém saber onde vou, com quem falo e o que penso a cada instante.

16.4.09

Estou cheia dessa história de “abaixo o choque de ordem fascista”, “agora que proibiram o cigarro, eu vou começar a fumar só de birra” (boa morte pra você) e “maldita lei seca que proíbe o consumo de bombons de licor”. Olhe em volta, cazzo. Onde você vive? Na Inglaterra? Aqui, o normal é a desordem. Aqui, as pessoas que estão tentando impor alguma ordem é que são subversivas. Você que diz que vai fumar em local fechado pra ser subversivo: quer ser persona non grata pra valer ou só figurante de anúncio da Ruffles? Se ligue. Seja o chato que só bebe água, Jeremias o bom, Arandir... aí você será perseguido com paus, pedras e tochas acesas, evitado nas ruas, silenciará salões -- um Onézimo encarnado.
Eu já disse: aqui, punk é ser mod...
Acho o nosso país um enigma. Como pode ainda estar de pé? Só pode ser pela inércia. É como se todos aprendessem tudo mal de propósito: dirigir, falar, conviver. Porque com um idioma mal-aprendido e meio-esquecido você não pode realmente cobrar nada a sério de ninguém, né? Aliás, poucos se lembram do idioma original para cobrar em primeiro lugar.
Tudo é marromeno porque ninguém tem medo de tomar um raio de Deus ou uma dura do governo; não existe pecado ao sul do Equador. Então ninguém se esforça para ser impecável, ou para ter excelência (não sei como essa farta distribuição de ISO 9001s). Todos fazem apenas o possível, e o fazem nas coxas, porque o bom é inimigo do ótimo.
Deixa eu dizer um último segredinho pra vocês. Falei no Arandir, não foi? Agora é super décadence fin-de-siècle gostar da obra de Nelson Rodrigues porque tem sacanagem, botando o dedo no queixinho e dizendo que “ele fez uma análise perspicaz da sociedade brasileira”. Ora, por favor. O que ele queria era expor a hipocrisia que velava os comportamentos. O canalha fingindo que não era canalha, a adúltera fingindo que não dava por aí, a lolita fatal fingindo que tinha sido seduzida. E em que isso culmina? Em gente fingindo que gosta dele pela sua “análise perspicaz” quando gosta mesmo é da sacanagem de época.

15.4.09

sobe, tio

Maldita reativação do Santos Dumont. Agora não consigo ficar cinco minutos sem uma turbina roncar na minha cabeça. Me parece que eles fazem a curva exatamente sobre o meu prédio. De vez em quando o barulho chega a ficar ameaçador, daí eu e JP pomos as mãos na cabeça e entoamos o mantra SOBE, TIO! SOBE, TIO! pro piloto lembrar de puxar o manche um pouco para cima enquanto o torce pro lado. Até agora temos sobrevivido.
Des'ree, Desire

Percebi outro dia que as rádios voltaram a tocar Des'ree. Outro dia vi o clipe dela passando na TV. E me toquei que estamos em 2009. E que o revival anos 90 começou.
Dito isso, passo a palavra para o Discodust, blog que apresenta eletrônica de ponta.
Eles indicaram o Desire que, pelo que ouvi, está fazendo uma espécie de eletrônica easy listening. Mirror mirror, por exemplo, poderia tocar numa Antena 1 sem qualquer modificação. Parece com Eurythmics, Carly Simon. Só queria saber por que não toca.

12.4.09

Sonhei que estava lendo o livro do século (deste). Parte dele se passava numa high school. Envolvia mutantes e geopolítica. Lembro especialmente da solução de um dilema: o cão não queria comer nada porque era na verdade um peixe (mutante). Havia um sujeito sorridente e ultrapopular chamado Swoomi (Swann + swami + swoon) que usava camisa listrada vermelho-e-branca e previa o futuro nas suas mínimas ações, mas não sabia disso.
Eram pelo menos três volumes, e eu lia o dois e o três. Ler, nos meu sonhos, significa encarnar num personagem com o qual me identifiquei.
Então, depois que li o início do terceiro volume, com os poucos sobreviventes do segundo volume se reunindo numa nova high school para o primeiro dia de aula, acordei e fiquei olhando para o teto, boladíssima.
- O que foi? - perguntou JP.
- Acabei de morrer numa explosão atômica.
- Que bom. Então pelo menos não doeu.
- Doeu, sim. Porque eu fui mané. Me escondi atrás de um troço de chumbo.
- Então... você foi mané. Deve ter doído muito.
- Horrivelmente. Eles tinham desenvolvido umas bombas atômicas de pequeno porte. Você via as nuvenzinhas de cogumelo. Eu abracei desconhecidos, deu tempo.
- Me falaram de não sei que filme o sujeito escapa de uma explosão atômica dentro de uma geladeira de chumbo.
- Foi... o último Indiana Jones. Eu vi.
- Bem idiota.
- Agora eu sei que não funciona. Eu sei, eu estive lá.
Fechei meus olhos para não ver minha própria carne queimada. A última coisa que senti foram os dedinhos do pé engelhados, um tocando no outro. E só.